sábado, 26 de fevereiro de 2011

CUBA




Trinidad

Cienfuegos


Varadero


Memorial do Che - Santa Clara


Cayo Largo

Cayo Rico

Playa Serena

Playa Paradiso

Iglesia de San Cristóvan - Havana


Plaza de la Revolución

Teatro Nacional de Havana


Calle de Hammel


Delfinário de Varadero

La Floridita

Iguanas de Cayo Rico
25.12.2010
Nossa aventura começou bem no dia do natal: embora nossos planos consistissem em almoçar tranquilamente com a família para embarcar apenas à noite, a TAM nos fez o favor de alterar o horário do vôo até Caracas para nos obrigar a chegar ao aeroporto às dez da manhã, para embarcarmos supostamente ao meio dia.
Resultado: não pude degustar tranquilamente a bebida típica natalina, que corresponde à representação tanto do sangue de Cristo, como seu primeiro milagre. De qualquer forma, ele não nasceu mesmo no dia 25 de dezembro, já que, conforme bem lembrado por minha irmãzinha, o Natal foi posteriormente alterado para esta data para “competir” com a festa pagã do Sol, comemorada pelos romanos. Sugiro retomarmos a data original, assim será mais fácil viajar no recesso de final de ano!
Enfim, ainda que não tenha bebido o suficiente para acordar com ressaca (ou ser flagrada pela “lei seca”), acordei um bagaço no dia seguinte, já que demorei para conseguir dormir em razão da ansiedade pela viagem. Não tem jeito: ainda que viaje mais que a média geral da população brasileira, sempre fico ansiosa na véspera...
Para quem me conhece, é fácil deduzir o mal humor que me dominou neste dia, já que não há nada melhor que sono para transformar profundamente minha personalidade (a fome também é um importante fator).
O embarque, para variar, atrasou um pouco, sem que, obviamente, tivessemos qualquer explicação sobre o atraso de quase uma hora (seria isto uma espécia de “premonição” do que estava prestes a acontecer?).
Embarcamos, enfim, mas não pudemos sequer desembarcar em São Paulo para fazer compras no freeshop, já que se tratava de mera “parada técnica” (para limpeza e embarque de paulistanos), durante a qual fomos compelidas a permanecer dentro do avião, sendo que por pouco não fomos “varridas” junto com toda aquela imundisse, tamanha era a falta de consideração consosco.
O vôo foi um verdadeiro inferno: a decolagem novamente atrasou (saimos umas três da tarde), sem que fosse tomada a iniciativa de servir um lanchinho sequer. Para completar, o serviço de bordo distribuia o almoço com uma lerdeza de dar inveja, o que nos causou um desespero profundo, pois nosso assento era um dos últimos. E, para completar, diversas turbulências fizeram com que o serviço fosse interrompido uma dezena de vezes.
São uns estúpidos mesmo. Tinham que, no mínimo, dar algo aos discriminados cariocas para comer, já que nós estávamos há mais de seis horas passando fome no avião. Meu trauma foi tão profundo (agravado, obviamente, pelo mal humor de não ter dormido suficientemente bem), que cheguei a cometer a blasfêmia de afirmar que nunca mais viajaria de TAM (como se no Brasil tivessemos muitas opções disponíveis...).
Depois de alguns escândalos, resolveram me servir a comida, até porque eu já estava quase desmaiando (de verdade!) de hipotensão. Para completar, um comissário de bordo muito folgado resolveu me dizer que a refeição durante o vôo seria mera “cortesia” da empresa, era o que faltava para eu mandá-lo para aquele lugar!
Por sorte,  não fui despejada no caudaloso Rio Negro (ou seria o amazonas?) em Manaus, segunda escala do vôo. Fizeram vista larga da minha revolta, fingindo que nada de grave havia acontecido. Me compadeci daqueles que estavam ainda mais atrás dos nossos assentos, pois estes sequer receberam a refeição, mas um mero lanchinho, pois o forno tinha quebrado!
Acho que a intenção era treinar os passageiros para fazer greve de fome em Cuba, como Farinas o fez corajosamente em protesto a manutenção de presos políticos por Fidel.
Logo no aeroporto de Caracas, na República Bolivariana da Venezuela, onde dormiriamos por um dia à espera da conexão que pegaríamos no dia seguinte à noite, foi possível ver milhares de propagandas do regime socialista e de todas as supostas vantagens de “VIVIR EN SOCIALISMO”, exaltando o incremento da produção de maiz (milho), aumento da taxa de educação média em 99 porcento, etc., tudo isso em cartazes pendurados no teto, como aqueles que estamos acostumados que exaltam as qualidades de determinada operadora de celular, ou as vantagens de alguma empresa aérea (todas evidentemente falsas!). Sobre a expressão “sistema aduaneiro venezuelano”, ainda no aeroporto, é possível vislumbrar uma “bela” foto do presidente “democrático” Hugo Chavez. Era, também, comum encontrar em outdoors espalhados pela cidade o slogan “Independência y Revolución”, em comemoração aos duzentos anos da revolução liderada por Símon Bolívar.
Após recolhermos nossas malas, não conseguimos encontrar um posto de câmbio de moedas estrangeiras. Embora tenha tentado pergntar para o receptivo que tinha ido nos buscar, este se recusou a indicar qualquer lugar adequado, se restringindo a insistir que entrássemos no carro que ele então explicaria tudo.
Na direção do hotel, ele nos informou que não era recomendado trocar dólares ou euros nos postos oficiais, pois o câmbio seria de quatro bolívares para um dólar, enquanto o “paralelo” seria de sete bolívares para um dólar, ou seja, quase o dobro! No entanto, não seria seguro trocá-los com desconhecidos no aeroporto, ou com taxistas, razão pela qual seria mais seguro trocar com ele mesmo! Me segurei para não dizer o que era muito óbvio: ele mesmo era um desconhecido para nós! De qualquer forma, me recusei a trocar com ele, dada tamanha a audácia de nos impedir de fazê-lo no aeroporto, ante a certeza de que prefeririamos nos beneficiar do mercado paralelo ou negro, como eles mesmo se autodenominam. Apesar do tempo inesperadamente prolongado que fomos compelidas a permanecer no país, não conseguimos descobrir qual a vantagem que os venezuelanos obtém com esse tipo de comércio.
Contudo, tampouco podemos trocar nossos euros no hotel, pois não são autorizados pelo governo a fazê-lo! (e o paralelo?). O mais absurdo, contudo, é que não são autorizados a aceitar euro, o que quase nos impediu de praticar um ato tão simples de consumo como o de beber água, já que era necessário o pagamento prévio. Por sorte, acabamos ganhando uma garrafa de um litro e meio, em “compensação” pela impossibilidade de utilizar a internet, já que um cabo havia se rompido e todo o Estado estava sem o serviço.
No entanto, a mais estapafúrdia de todas as idiossincrasias locais foi a do fuso horário: quando o receptivo nos informou a hora, tive a certeza de que o relógio dele estaria meia hora atrasado ou adiantado, pois, enquanto o nosso marcava onze horas da noite, o dele marcava nove e meia! Como eu acreditava não existir fusos horários “quebrados” por questões óbvias de facilitar a vida dos indivíduos em um mundo cada vez mais globalizado, quase apostei com ele que ele estava errado.
Ocorre que ele é Venezuelano e deve estar acostumado com as sandisses de seu presidente. E esta é realmente a maior de todas: o único país do mundo (pelo menos que eu saiba) que resolveu adotar um fuso horário intermediário! Ainda que geograficamente possa fazer sentido, pois talvez Caracas se situe entre dois fusos, estrategicamente é uma tristeza, pois dificulta tremendamente a relação com todos os demais países do globo terrestre. A não ser que a estratégia do Sr. Chavez seja exatamente esta...
Não foi a toa que a Flá teve um sonho nada surreal considerando o país em que dormiu: que na Venezuela teria dois fusos horários, um oficial e um paralelo!
26.12.2010
Ficamos supresa com a marailhosa vista do mar, da janela do nosso hotel, principalmente porque no dia anterior tinhamos achado que o hotel estaria situado no “meio do nada”.
Decidimos fazer um passeio turístico pelo centro histórico de Caracas, situado a uma distância de uns quarenta quilômetros do nosso hotel. Embora o taxi disponível no hotel fosse um terço mais caro que o “paralelo”, a ser pego “pela rua”, resolvemos renunciar a esta possível aventura e investimos em um taxi um pouco mais seguro. Solicitamos, contudo, que parasse no aeroporto, que estava a uns cinco minutos do hotel, para que pudessemos sacar dinheiro em um dos caixas eletrônicos, caso os cartões de crédito brasileiros fossem aceitos por ali.
Depois de muitas tentativas fracassadas, conseguimos sacar uma quantidade praticamente irrisória de bolívares, apenas suficiente para arcar com o pagamento do taxi de ida e volta, com alguns trocadinhos a mais. Isto porque o valor máximo por saque era muito limitado e a administradora do nosso cartão apenas autoriza quatro saques no exterior sem pagamento de taxas.
Durante o percurso em direção a Capital, o taxista exaltou todas as qualidades do seu presidente populista, principalmente o fato de ele distribuir dinheiro para os pobres.
O mais divertido, contudo, foi quando ele percebeu nossa exaltação ao vermos aquelas casinhas no morro pintadas de diferentes cores: ele mencionou orgulhosamente que foi o próprio presidente quem distribuiu as tintas para seus habitantes, demonstrando sua solidariedade com os menos afortunados!
E isso tudo em meio a várias casas totalmente destruídas pelas recentes enchentes catastróficas, que, inclusive, justificaram a edição de medidas ainda mais ditatoriais, autorizando o presidente a governar por meio de decretos, sobre os mais diferentes assuntos pertinentes à “República”.
Não faltaram também outdoors, cartazes, inscrições em passarelas, com o objetivo de ressaltar o caráter socialista do governo, bem como exaltar o nacionalismo de seus cidadãos. As cores da bandeira nacional (amarelo, vermelho e azul) são vistas por toda a estrada, pintadas tanto em meios-fios como em pedras casualmente encontradas pelo caminho.
Descemos do táxi em frente ao Capitólio, que fica logo ao lado do gabinete de “despachos do executivo”, ou seja, a fonte de todas as “pérolas” emanadas da mente brilhante do Presidente da República.
O herói nacional não poderia deixar de ser Símon Bolivar, libertador não apenas da Venezuela, como também de outros países latino americanos (Bolívia, Peru e Argentina, se não estou enganada). Não apenas o próprio nome do país faz menção ao herói: República Bolivariana da Venezuela, como a moeda utilizada: bolívares.
A praça central, portanto, apenas poderia ser denominada Símon Bolívar e acho que nem preciso dizer de quem é a estátua que ornamenta o centro da praça... Ao redor da praça encontramos uma Igrejinha, o prédio da Prefeitura Municipal e o Parlamento. O Tribunal Superior (equivalente ao nosso STF) usa as instalações da antiga residência do próprio Símon Bolívar, “nascido e criado” naquele país.
O metro fica bem ao lado da residência do herói nacional e ficamos surpresa com o valor da passagem: o correspondente a aproximadamente 25 cents de dólar, o que nos induz à inarredável conclusão que a passagem é necessariamente subsidiada pelo governo, ou que a “empresa” prestadora do serviço é o próprio governo.
A impressão que tivemos corresponde exatamente à verdade: parece um metro de terceiro mesmo, todo sujo, desorganizado e escuro. Totalmente diferente em relação as modernas instalações do aeroporto internacional.
E para “sentirmos” um pouco o grande paradoxo deste país que se autointitula socialista, decidimos ir ao tal shopping center (Sambil), que nada tem a dever para os grandes shoppings centers de todos os grandes países de economia declaradamente capitalista.
Além dos produtos serem verdadeiramente caros, a maioria com um preço superior àqueles vendidos no Brasil, onde já são mais caros que a média mundial (o preço do Big Mac do Brasil só perde para Noruega ou Suiça, segundo o “índice Big Mac”), encontramos todas as lojas que movem a economia capitalista mundial, desde Pólo, Guest, Levi’s, Mac, Sony, etc.
Claro que não poderia faltar o próprio Mac Donald´s, embora tenhamos preferido almoçar no Hard Rock Café, após nossa busca frustrada por culinária local (o que seria isso?).
Para finalizar nosso “turismo rodízio de pizza” (expressão que li em um livro e gostei tanto a ponto de plageá-la), fomos até o teleférico mais comprido do mundo (pelo menos o mais comprido que já andei), pois, embora o pico da montanha tenha apenas um kilômetro de altura, em diversas partes ele anda quase que exclusivamente na vertical.
Como a fila para o ingresso no teleférico era iguamente kilométrica e, partindo do raciocínio lógico de que tudo que sobe desce (e isso inclui pessoas), chegamos a conclusão que seria impossível sair do teleférico para conhecermos o parque situado no topo, pois não teriamos tempo disponível para aguardar a fila para descida sem perdermos o vôo. Então, permanecemos no mesmo carrinho e fizemos o tour da descida, junto com uma mulher que mal conseguia falar, pois estava congelada de medo.
Retornamos para o hotel e aproveitamos o pouco tempo que pensávamos que nos restava assistindo o canal do governo de Chavez (quando liguei para recepção para perguntar qual era o canal do governo, a recepcionista me informou um número que correspondia ao do governo e um outro que correspondia ao do “não governo”, expressão esta que somente depois de colocar no canal correspondente foi que consegui descobrir que significava oposição. Há outros canais privados, pelo menos no nosso hotel, mas não era tão divertido quanto o do Chavez).
Após a transmissão de Chavez cantando o hino nacional, ou algo que o valha, ao receber em seu país o presidente da Bolívia Evo Morales (qualquer semelhança...), assistimos a um discurso seu, para centenas de venezuelanos, no qual afirmava orgulhosamente, em meio a efusivos apláusos, que distribuiria mais de quatrocentas casas para as vítimas da imensa tragédia causada pelasa enchentes (para cuja prevenção o governo em nada contribuiu, g.n.). E acrescentou que absurdamente ainda há quem tente convencer a população de que ele é um ditador! Apenas esqueceu de explicar o nexo causal entre a premissa e a conclusão!
Chegada a hora do transfer para o aeroporto, descemos pontualmente e, por sorte, não encontramos com o antipático sujeito do dia anterior. Aproveitamos, ainda, para trocar um dinheirinho com este, pelo câmbio paralelo, que obviamente beneficia ambas as partes.
Ocorre que nossa sorte estava com os minutos contados: logo ao chegarmos ao aeroporto, aquele sujeito mal encarado estava de pé para nos receber e indicar o local de check-in (como se fôssemos retardadas e não soubéssemos perguntar...).
A chegada daquele sujeito seria indiscutivelmente um mau agouro. Ao chegarmos próximo a área do suposto check-in, sentimos um frio na espinha ao nos depararmos com uma fila de mais de cem metros de comprimento, cujos integrantes pareciam estar há horas exatamente no mesmo lugar, pois já haviam se acomodado resignadamente seja sentadas no chão, seja nas próprias malas, ou embalagens de eletrodomésticos (que não eram poucas).
Este aspecto concernente ao volume excessivo de bagagens, que incluia a maior diversidade de produtos eletrônicos, entre os quais os aparelhos de DVDs encabeçavam a lista, intensificava ainda mais o transtorno, principalmente visual, já que era praticamente impossível concluir qual era, de fato, a direção da fila, que mais parecia um amontoado de caixas de papelão e bagagens entremeados de alguns seres humanos inertes.
Sem acreditar que aquele seria nosso destino, perguntamos para o responsável pela companhia aérea o que deveríamos fazer (nosso receptivo nada soube informar, apenas saiu correndo na primeira oportunidade), ocasião em que ele se restringiu a apontar o último lugar naquela kilométrica fila.
Não precisamos ficar muito tempo na fila para sermos informados de que teria havido “sobreventa”, expressão esta utilizada na lingua deles para denominar o malsinado “overbooking”. Nesta terra a prática é tão mais comum que a nossa que há até palavra específica na sua língua, dispensando estrangeirismos com tons eufemísticos.
O mais interessante (para não dizer trágico) é que mesmo com a grande maioria dos passageiros cientes da tal sobreventa, eles não prestavam sequer uma explicação. Inclusive quando uma das funcionárias tentou me enrolar, inventando uma explicação qualquer, seu superior lhe repreendeu rudemente, dizendo que não era para dar quaisquer informações aos passageiros, que deveriam aguardar calados na fila! Este foi o tom da singela observação! Bem vindos a Cuba!
A solução foi, então, buscar esclarecimentos dos demais passageiros, muitos deles cubanos, acostumados com esta prática que já se tornou banal. Nos esclareceram que tal prática é muito comum em épocas de alta temporada, como fim do ano, mas que poderiamos ficar tranquilas que nos pagariam o transporte e hotel. No entanto, nada disso compensaria um dia a menos em Havana, já que teriamos apenas dois dias para conhecer esta a cidade.
Me prontifiquei, então, a falar com o responsável geral afirmando que eu tinha conhecimento da sobreventa e que concordaria em ficar mais um dia na Venezuela desde que conseguisse um adiamento do vôo de retorno, seja de um ou dois dias, ocasião em que ele disse que atenderia prontamente minha solicitação. Só então fiquei mais tranquila, embora estivesse longe de saber que aquela promessa de nada valeria e que, por muito pouco não deixamos de conhecer Havana.
Os trâmites foram um verdadeiro inferno: foi necessário aguardar o término do check-in para que todos os passageiros restantes fossem reunidos para serem transferidos, como bagagens perdidas, para um depósito, ou melhor, um hotel.
Como as necessidades do ser humano devem se adequar aos horários dos serviços oferecidos (e não o oposto), acabamos ficando sem jantar, pois este serviço já tinha se encerrado à meia noite, horário em que conseguimos chegar ao hotel, após cinco horas de espera na fila. Obviamente, o serviço de entrega no quarto não seria coberto pela empresa aérea, e as ligações, tanto locais, quanto para o exterior, se restringiriam a “longos” três minutos, para solução de todas as pendências decorrentes da desorganização da empresa.
Claro que tive que descer para pagar a refeição antecipadamente, já que, tanto na Venezuela, quanto em Cuba (descobririamos isso mais tarde), somos presumíveis ladras, sendo, portanto, absolutamente coerente se exigir o pagamento antecipado de todos os produtos e serviços.
27.12.2010
Passamos o dia inteiro resolvendo a questão do adiamento do vôo de retorno e quase perdemos o transfer para o aeroporto, pois decidiram adiantá-lo em uma hora, sem se preocupar com quem não estava no hotel e que, portanto, estaria incomunicável.
Fomos as primeiras a despachar as malas e logo depois tivemos a confirmação do adiamento do vôo de volta, fato este que demorei a crer, dada a absoluta ineficiência da empresa aérea.
Obviamente que alguns passageiros deste vôo passarão pelo mesmo suplício que passamos no dia anterior, pois houve mais de trinta “encaixes”, e se o princípio de que dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar ao mesmo tempo estiver correto, alguns farão um “city tour” compulsório por Caracas.
Mais tranquilas ao perceber que as coisas estavam se ajeitando, aguardamos pacientemente o vôo, cujo atraso já era certo. Dormi durante todo o trajeto, mas o que foi mais cansativo mesmo foi esperar as malas (incrivelmente demoramos mais de duas horas para pegar nossas malas, já que uma por uma é passada pelo raio x, antes de ser deixada na esteira!).
Depois deste absurdo de espera, descobrimos que nosso transfer já havia sido dispensado, e que deveriamos aguardar o táxi. Fazia um frio completamente atípico para Cuba (menos de quatorze graus!), já que o inverno deles costuma ser mais ameno até que o nosso.
Desta vez, evitamos cometer a estupidez de deixar para trocar o dinheiro depois e fomos diretamente a casa de câmbio mais próxima que havia no aeroporto para obter os tais pesos cubanos conversíveis (CUCs).
Como já haviamos lido bastante a respeito desta moeda paradoxal, sabíamos que ela valia cerca de 26 vezes mais que o peso cubano propriamente dito, mas foi inserida na economia cubana para evitar que os turistas se beneficiassem dos subsidios dados pelo governo para o povo cubano, que abrange praticamente todos os produtos.
Sabíamos, também, que apesar de seu valor estar atrelado ao dólar, esta é a moeda que, digamos, é a mais “discriminada” pelo governo cubano, já que a taxa que se cobra por seu câmbio é de vinte por cento, diferente das demais que é de dez por cento.
Desta forma, fomos suficientemente precavidas para levar euros, os quais foram trocados desde logo.
Tampouco tivemos problema para utilizar nossos cartões de crédito, tanto para compras quanto para saque, já que, por sorte, a administradora do nosso cartão não tem sede nos EUA.
Ao chegarmos no hotel Habana Libre (antigo Hilton), a única coisa que conseguíamos pensar era em uma confortável cama. Dormimos ouvindo o zumbido do vento no 23º andar, apenas um a menos do qual Fidel governou o país por alguns meses após a Revolução!
28.12.2010
Acordamos renovadas, depois de uma longa e merecida noite de sono! Ao abrirmos a janela do quarto, tivemos a grata surpresa de nos depararmos com uma vista panorâmica da cidade, o que serviu como uma espécie de aperitivo, já que, em razão da famigerada “sobreventa”, só poderemos conhecer a cidade de verdade no próximo ano...
A primeira coisa que me chamou a atenção foram as variedades de cores dos carrinhos, dando a impressão que centenas de jujubas teriam sido despadas e rolavam pelas ruas de Havana.
Como o quarto era de frente para o mar (a atendente nos dissera que iria tentar compensar todos os aborrecimentos que haviamos tido, nos entregando o melhor quarto do hotel, que, diga-se de passagem, nem era grandes coisas), vimos o famoso malecon (espécie de calçadão da praia, construído como forma de conter o avanço do mar), com a baía ao fundo.
Depois de tirar algumas fotos, inclusive do Capitólio, graças ao “avantajado” zoom da minha máquina fotográfica amadora, fomos degustar o café da manhã, maravilhoso, por sinal.
Enquanto saciávamos nosso estômago faminto, foi possível dar uma espiada naquela piscina que eu já tinha visto em algum filme ou documentário cujo nome não me recordo no momento.
Após o check-out, fomos pegar o automóvel já reservado e decidimos entrar em contato com a nossa receptiva para perguntar por que ela não havia nos entregado os vauchers dos hotéis de Cienfuegos e Trinidad.
Minhas pernas tremeram ao ver, de longe, a expressão de horror da Flá. Logo fiquei sabendo o motivo: simplesmente trocaram todas as nossas reservas e teriamos que alterar todo o nosso percurso, pois ficariamos primeiro em Trinidad (apenas uma noite) e só depois iriamos para Cienfuegos (por duas noites). Só que não tinha sido este o combinado, pois o retorno de Trinidad para Santa Clara seria muito mais cômodo. De qualquer forma, não adiantava se insurgir contra a estupidez da empresa, mas apenas se resignar, pois todos os hotéis já estavam lotados e nenhuma alteração seria possível.
Já na direção do automóvel, que fazia um barulho nas rodas como se estivesse mal alinhado, fomos em busca da saída de Havana, por um túnel subaquático que leva até a Vila Panamericana e à autoestrada.
Em determinada parte do malecón foi engraçado ver as pessoas literalmente tomando banho de mar, já que as ondas batiam contra a parede e uma quantidade significante de água respingava na calçada. Parece que mais alguns anos de aquecimento global serão suficientes para permitir que o mar engula o famoso malecon.
Depois de nos perdermos umas duas ou três vezes, finalmente conseguimos encontrar o tal túnel que daria na auto-estrada para nosso destino.
Embora o barulho estivesse realmente chato, não parecia nada grave. No entanto, após percorrermos uns cinquenta quilômetros, ele foi se intensificando a ponto de se tornar insuportável, então decidimos ligar para a empresa a fim de verificarmos onde estaria uma oficina mais próxima.
Por sorte, havia uma em Guiness, e o mecânico logo desvendou o mistério: a última pessoa que trocou o pneu deixou as roelas da roda frouxas, que foram se desgastando e já estava corroendo a própria roda. Ou seja: o pneu poderia ter saído e sofreríamos um grave acidente.
Claro que o automóvel não foi substituído, conforme esperávamos que fosse, mas o mecânico simplesmente substituiu a roda do nosso carro, por uma de um outro automóvel com defeito que se encontrava na oficina.
Depois de mais de uma hora de espera, conseguimos retomar nossa viagem, ainda um pouco preocupadas com a gambiarra feita. Chegamos a conclusão de que o mecânico é, de fato, um artista, principalmente em Cuba, onde os automóveis tem uma vida útil bastante significativa.
O que mais nos chamou a atenção na estrada foram as propagandas políticas, em outdoors, do regime socialista, chegando ao extremo de haver expressões como “socialismo o muerte”!
Chegamos à noite em um hotel indescritivelmente brega, todo colorido, como se isso fosse agradar os turistas (até que alguns turistas pareciam bem animadinhos no meio daquele circo).
Quando saímos do jantar, que, apesar de sofrível, conseguiu nos supreender dada a cafonice do hotel, nos deparamos literalmente com um homem vestido de palhaço para animar uma meia duzia pessoas que não tinham nada melhor para fazer (provavelmente americanos)
O mais engraçado, contudo, foi a minha reação com uma mulher que não parava de berrar, aparentemente em um quarto próximo. Quando eu já estava estourando de raiva, falei para Flávia que iria abrir a janela e mandá-la calar a boca, pois ela não estava na casa dela.
Só que imediatamente ao abrir a janela da varanda, descobri que não era ninguém berrando, mas sim uma mulher “cantando” no microfone os números que estavam sendo sorteados no bingo do hotel. Ninguém merece!
Também achei surreal o espaço vazio em um armário que, por sua altura e largura, supostamente abrigaria um freegobar. Não resisti e perguntei à recepcionista do hotel o que tinha acontecido com o aparelho. Surpreendentemente ela me respondeu que eles apenas colocam o freegobar no quarto daqueles que se dispõem a pagar uma espécie de “combo” que inclui alguns tipos de bebidas! Tive que cair na gargalhada, principalmente porque o hotel é daqueles que se autoqualicam “all inclusive” – só faltou incluir aí a expressão “sheet” entre estas palavras.
Não sei se minha reação foi um pouco incomum, mas ao retornarmos do jantar nos supreendemos com um freegobar instalado no seu devido lugar (obviamente sem as bebidas).
29.12.2010
Acordamos com um humor um pouco melhor (nada como uma noite de sono), tomamos um café da manhã razoavelzinho e fomos à praia de roupa mesmo, já que estava muito frio.
Logo descobrimos que estava agradabilíssima, colocamos o biquini, mas não conseguimos chegar a mergulhar, pois a água estava sensivelmente gelada, diferente da propaganda enganosa feita por um português que havia informado que a água estaria mais quente do dia anterior.
A península de Ancon, ao sul de Trinidad, tem praias belíssimas, já que o azul clarinho é quebrado por um amontoado de algas (ou seriam rochas?), que lhe dão um charme todo especial.
Depois do almoço, pegamos o carro para conhecer a cidadezinha de Trinidad (uma gracinha, por sinal). Pessoas muito simpáticas, visitamos igrejinhas, a casa onde se fazia reuniões revolucionárias, um barzinho no qual toca música típica e uma torre de onde há uma vista belíssima daquela cidadezinha pitoresca de casinhas coloridas e pessoas com um enorme sorrizo esboçado no rosto. Pessoas nas janelas conversando animadamente e carroças nas ruas, brigando com bicicletas, pedrestes etc. É só dar um thauzinho que todos respondem ao aceno animadíssimos, como se tivessem sido premiados.
Mas o mais engraçado de tudo foi o guardador de carros. Era um senhorzinho de uns setenta anos, uniformizado com um colete vermelhor que informava sua função e carregando na mão uma placa que dizia que se tratava de estacionamento público!
Pedi para que ele tirasse uma foto comigo: foi o suficiente para ele inflar os peitos de orgulho, pedir alguns segundos para ajeitar o colete, fechando-o adequadamente, e me lançar um generoso abraço! Foi muito interessante ver a sinceridade da sua felicidade estampada em seu rosto! E, como se não fosse suficiente, logo apareceu sua mulher, poucos anos mais jovem, insistindo que lhe mandássemos a foto.
Estranhei seu pedido, já que não acreditava na qualidade da internet naquele vilarejo. No entanto, como ela falou com tanta convicção que me daria su “direccion”, me convenci de que ela navegaria na rede. Só após começar a anotar a suposta “direccion eletronica”, foi que percebi que o endereço só era eletrônico mesmo na minha cabeça, pois ela pretendia que eu enviasse a foto por aquele correio do qual sequer lembramos mais a existência para correspondências comuns! Pedi apenas que informasse o CEP e expliquei que deveria demorar, pois terei que “revelar” as fotos. De qualquer forma, foi muito agradável ser tão bem acolhida por ambos!
Quando íamos em direção a Cienfuegos, encontramos uma série de animaizinhos pelas ruas, como cabritos e vacas, o que nos fez compreender facilmente a razão pela qual muitos já nos advertiram sobre os riscos de dirigir à noite pela estradas.
30.12.2010
O café da manhã era de dar tristeza: a máquina de café servia mais água que propriamente café e a senhora do omelete não sabe fazer nada diferente disso, pois ela ignorou solenemente nosso pedido de “ovos revueltos” e nos entregou um omelete mesmo.
Depois fomos em busca das toalhas de praia. Nos sentimos em um típico estabelecimento público, altamente burocratizado: o garçom do café da manhã nos informou que seria necessário se dirigir até a recepção, onde nos indicariam com quem recolher referidas toalhas. Atendida esta exigência, chegamos no local, mas a responsável pela entrega das toalhas informou, revoltada, que já havia dito para as recepcionistas que não havia toalha. Quando retornamos à recepção para fazer um simples requerimento no sentido de ser fornecida toalhas de banho “comuns”, ela disse que seria necessário solicitá-las a camareira, mas que esta não entregaria outra, caso já tivessemos toalhas no nosso quarto. Desiludida, tentei argumentar que eu tinha o mesmo direito dos outros hóspedes e que, portanto, tinham que me fornecer qualquer tipo de toalha e aí, então, ela me disse que eu teria que resolver a questão com a senhora sentada na mesa a frente, cuja placa indica ser a de “relações públicas”. Esta, por sua vez, informou que iria falar com sua chefe e, passados uns quinze minutos conseguimos obter as famigeradas toalhas de praia (uma delas com rombos gigantescos), que foram trazidas por um subordinado qualquer.
Na realidade, todo este esforço foi em vão, pois não conseguimos sequer mergulhar no mar. Além da água ser escura, a areia é lodosa, o que nos privou de qualquer estímulo para cair no mar, até porque a água estava mais fria que a do dia anterior.
Decidimos, então, fazermos um programa de índio mesmo: fomos até a piscina do hotel, mas não conseguimos ficar mais de meia hora em meio aquela cafonice toda (além do mais, só tinha a cerveja Cristal, mais fraquinha e portanto pior que a Bucanera, nossa preferida).
O almoço conseguiu ser pior que o jantar do dia anterior, pois a única “carne” era um hamburguer muito mal temperado e fomos novamente privadas do prazer de comer os cristianos (feijões) como no Brasil, já que eles foram servidos como salada!
Nosso hotel não fica propriamente em Cienfuegos, mas em Rancho Luna, ou seja, na pontinha da baía. Como o mar não tinha um atrativo sequer, resolvemos partir para conhecer a cidadezinha e tentar tirar algum dinheiro, pois estavamos quase sem “cus” (é assim mesmo que eles pronunciam a moeda cubana utilizada pelos turistas, o cuc).
Todos os monumentos históricos se situam na pracinha José Martí (não poderia ter outro nome), o que facilitou bastante a atividade da fotógrafa.
Mas o mais interessante mesmo eram as propagandas políticas, exaltando o Che Guevara, através de pinturas e mensagens, bem como os cinco heróis nacionais, em referência aos espiões cubanos detidos nos Estados Unidos.
Após a longa “caça” aos caixas eletrônicos, encontramos dois cuja informação era de que não seria possível sacar mediante cartão internacional. Angustiadas com a possibilidade de ficarmos à míngua, na ilha, sem dinheiro sequer para pagar a taxa de embarque de regresso, fizemos uma tentativa infrutífera de tentar enfiar na marra o mastercard, que foi solenemente rejeitado.
Insistimos tentando inserir o Visa, tentativa esta que acabou resultando exitosa. Quando aqueles duzentos CUCs finalmente sairam pela portinha, começamos a pular como duas crianças em pleno centro da cidade, como se tivessemos sido as ganhadoras de uma loteria.
Prosseguimos o passeio mais aliviadas com a segurança de não termos que vendermos nossos passaportes para obtermos dinheiro, e fomos em direção ao passeio do prado e retornamos por uma rua de pedestres que lembra a sete de setembro, ou alguma equivalente.
Dentro de uma loja de CDs, dois rapazes entraram atrás, oferecendo seus CDs, alegando que teriam mais variedades. Apenas depois de um tempo fui perceber que se tratava do comércio paralelo e que não seria um bom negócio sair andando por aí com Cds falsificados.
Na lojinha, compramos um de salsa e outro de reaggeton, este último é o estilo que está fazendo sucesso entre a garotada daqui.
Passamos, ainda, em uma loja de charutos e resolvemos pegar um exemplar do Cohiba, considerado o melhor do país, em razão da qualidade da seleção de fumos.
Visitamos o “malecon” (algo como calçadão) de Cienfuegos, mas, sinceramente, não concordamos com o apelido que deram a baía de Cienfuegos, ao qualificá-la como a “pérola do Caribe”, por ser considerada a baía mais linda da região. Apesar de toda a poluição, a baía de Guanabara venceria, mas apenas não pode competir neste “concurso” em razão da sua posição geográfica.
Por fim, visitamos a “punta Gorda” que fica no final do passeio do prado, e onde há um castelinho construído no início do século passado, no estilo árabe.
No retorno, pegamos a mesma estrada cheia de carroças, bicicletas, ônibus do início do século passado, entre outros veículos muito esquesitos.
À noite, conseguimos um jantar bastante razoável em um restaurante italiano a la carte, no nosso “fantástico” hotel.
31.01.2010.
Último dia do ano! A expectativa era grande, ante os pequenos transtornos que, contudo, não conseguiram abalar nosso bom humor. Caso estivessemos em Havana, aproveitariamos para visitar uma Santeria para fazer um descarrego ou algo do gênero, mas nosso destino seria outro: Varadeiro, não sem antes visitarmos Santa Clara, a cidade onde Fidel derrotou definitivamente o ditador Batista e, em consequencia, local escolhido para se erguer um monumento em homenagem a Che Guevara.
Logo depois do café da manhã, ao tentar tomar um café expresso no bar da piscina, fiquei pasmada com a ineficiência do serviço: enquanto um dos garçons estava pingando de suor de tanto trabalhar, já que tinha a incumbência de lavar as xícaras de café e ao mesmo tempo servir uma fila de pessoas que não parava de crescer, já que era o único local onde era possível tomar um café decente, outros dois garçons conversavam entre si animadamente, sorvendo invejáveis goles de cerveja!
Não pude deixar de me indignar com a falta de solidariedade dos demais, em relação ao seu colega de trabalho... Afinal, este não seria um dos pilares do socialismo, ou estou muito enganada?
Obviamente, não resisti à tentação de lhe perguntar por que os outros não o ajudavam. E a resposta foi muito simples: os outros dois foram contratados para servirem as bebidas alcoolicas e atenderem as mesas, enquanto ele foi contratado para o café! Quase não acreditei naquilo, imaginando como os outros dois ficariam perdidinhos no final da tarde, enquanto o garçom do cafezinho tirava sua “forra”.
Enfim, foi então que tive praticamente certeza que aquele hotel só poderia ser do governo. E que supresa não tive ao fazer tal pergunta a recepcionista (a curiosidade ainda me matará!) e ser informada de que absolutamente todos os hotéis de Cuba pertencem ao governo! Agora todas os episódios kafkianos estão devidamente explicados... O lado negativo é que ainda teremos tormentosos momentos pela frente, caso não consigamos transformar rapidamente nossa perspectiva do mundo.
Pegamos nosso carrinho, para irmos em direção a Santa Clara. Embora fosse um pouco fora de mão, dada aquela confusão que fizeram no nosso roteiro, a viagem valeu a pena por nos permitir admirar as peculiaridades locais.
Após deixarmos Cienfuegos, passamos por duas cidadezinhas interioranas Cruces e Palmiras e até decidimos ceder a nossa perspectiva capitalista para oferecer uma carona a dois transeuntes (na realidade, eles quase se jogaram dentro do carro quando fomos pedir informações, sobre a forma mais rápida de chegarmos a Santa Clara).
Depois deste episódio, decidimos que só pediriamos informações para pessoas de bicicleta ou que tivessem caminhando no sentido oposto da pista.
Como o transporte público por aqui é totalmente ineficiente, parece que há toda uma sistematização das caronas, pelo que nos foi explicado. Dependendo da cor da placa do carro (os cubanos possuem carros com placas amarelas, os turistas, azul e os taxistas, vermelha, salvo engano), você pode ser ou não obrigado a dar carona. Se não o fizer, um fiscal pode inclusive te multar! Dá para acreditar!
E muitos cubanos pedem carona balançando várias notas de dinheiro, o que nos fez especular se ele pretendia pagar pela carona, descaracterizando totalmente o instituto, ou se era uma demonstração de que não tinha interesse em assaltar, mas o próprio dinheiro poderia ser roubado, então a técnica não seria muito eficaz.
Passamos por diversas fazendas comunitárias ou cooperativas, como preferem chamá-las, nas quais se plantavam banana, cana-de-açucar, laranja, etc., sendo certo que algumas delas ainda eram universidades agrícolas (alunos estudam para o exercício de determinada profissão e trabalham para o governo, como forma de “financiamento” de seus estudos).
Quanto mais adentrávamos no interior da ilha, se intensificavam as propagandas político revolucionárias, como se a revolução tivesse acontecido há alguns meses atrás.
Vimos muitas referências ao dia 26 de julho, que foi a data em que Fidel e seus companheiros tentaram invadir o quartel da Moncada em Santiago, mas acabaram sendo detidos ou mortos por Batista. Esta data serviu, então, como designação do movimento revolucionário. E as cores da bandeira não podiam ser outras que vermelho e preto (nada contra os flamenguistas...).
Havia muitas referências aos cinco espiões que foram presos nos EUA e lá se encontram até hoje. Eles são tratados como heróis nacionais, só não tendo sido ainda santificados em virtude de estarem vivos, mas em breve o serão.
Em quase todos os pontos de ônibus (que, contudo, não eram muitos), havia frases socialistas, algumas declarações de Fidel, estímulos ao trabalho, tais como “quanto mais você produzir, mais terá”, entre outros dizeres de cunho nitidamente propagandístico, com incitação, inclusive, a luta armada, como na incrível tríade: “estudo, trabalho e fuzil”!
Isso tudo em meio a carroças que faziam as vezes de carros e ciclistas que levavam de tudo na bicicleta, desde rolos de capim até bolo para comemorar a passagem de ano. Sem mencionarmos as mulheres que já estavam se embelezando para a virada: parecia um concurso de rolinhos, em que a vencedora seria aquela que portasse os maiores da categoria.
Enfim, o passeio de carro, longe de entediante, foi para lá de divertido, já a sensação era de ter dado um verdadeiro mergulho no passado.
Após este percurso que nada teve de oficialmente turístico, mas que foi muito mais revelador da natureza do povo cubano, bem como da realidade de vida que perdura incrivalmente até a atualidade (Fidel estava certo ao declarar que sem propaganda não há revolução, mas deveria complementar que sem ela tampouco um mau governo consegue se manter no poder por tantos anos), chegamos finalmente a Santa Clara.
Não foi dificil identificar o monumento em homenagem ao Che, pois é possível vê-lo de longe, já que mede cerca de dez metros de altura, caso minha estimativa esteja correta.
Por trás do monumento, há um pequeno museu guarnecido de objetos pessoais do guerrilheiro, além de inúmeras fotos, mas o mais interessante foi uma das cartas em que mencionava que o melhor amigo de Che não era Fidel Castro, mas sim Camilo Cienfuegos, que igualmente participou da revolução, mas acabou desaparecido por motivos ignorados.
Os restos mortais do Che foram levados para o local em 1997, depois de uma negociação entre o governo cubano e o argentino (até porque o guerrilheiro é natural de Córdoba e faleceu na Bolívia), sendo que, desde então, há uma chama que vem sendo mantida acesa.
Além do Che, há inúmeros outros nomes, provavelmente de pessoas que igualmente participaram da revolução. Por um lapso muito grande e impassível de ser justificado, quase perguntei à senhora que vigiava o local, onde estavam os restos mortais de Fidel... Mas logo me lembrei que, apesar de sua saúde não estar tão bem, ele ainda não se foi.
Tive que me segurar para não rir quando a vigia se referiu ao Fidel Castro como “comandante”, ao explicar que ele foi quem realizou as negociações para vinda das cinzas do Che. Pelo visto, o povo cubano continua se sentindo um grande exército, que obedece sem pensar nem em que é realmente seu chefe.
Na lojinha, entre centenas de livros referenetes às “reflexões de Fidel”, encontrei um que me chamou a atenção, já que continha a famosa frase de “a história me absolverá”.
Sabendo que isso foi dito por ocasião de seu julgamento devido a frustrada tentativa de invasão do quartel da Moncada, em 1953, isso soa até como uma espécie de profecia invertida, já que, embora seja indiscutível que seu nome já entrou para a História, o mesmo não se pode dizer sobre a sentença final.
Como já tinhamos desviado substancialmente o caminho para saber que Che era um péssimo aluno em matemática e música, embora excelente em história, além de ver as fotos daqueles barbudos feiosos, que decidiram manter a aparência de seus anos de “exílio” na selva, mesmo depois de terem novamente acesso a barbeadores de qualidade, decidimos conhecer a cidadezinha, que nada se difere das outras já visitadas.
Nos surpreendemos em encontrar a famosa sorveteria da Copélia, que achávamos que tivesse só em Havana, mas não foi possível experimentar o sorvete, já que ela só abriria dentro de trinta minutos e a fila já estava gigantesca.
Isso me fez refletir sobre a gravidade do que é praticado pelo governo cubano: ele rouba parte substancial da vida do ser humano, ao lhes impor filas kilométricas para aquisição de todos os tipos de produtos e serviços... E o mais impressionante é que as pessoas não se insurgem contra isso! Se somassem todo o tempo perdido em filas, chegariam à conclusão de que seria superior ao tempo que muitos bandidos já passaram na cadeia, sendo que o único “crime” que cometeram foi terem nascido na ilha errada. Acho que pouco provável que Fidel inclua este aspecto em suas reflexões, até porque dificilmente foi complido a aguardar em filas como todos os demais reles mortais cubanos.
Nos conformamos em entrar em uma lanchonete e tomar apenas uma tukola que estava um purgante de tão quente (coka cola cubana, cujo sabor – quando gelada – considero até melhor que a coca cola original, pois é mais docinha).
Tiramos umas fotos na pracinha central da cidade e de alguns prédios históricos, além de um cinema denominado cine Camilo Cienfuegos (parece até que possuem aquilo que os psiquiatras chamam de TOC, transtorno obsessivo compulsivo por nomes revolucionários).
O mais interessante foi ver uma espécie de mini-carrocinha, que ficava circulando ao redor da praça, levando criancinhas puxadas por uma cabrinha, a qual, por sua vez, era conduzida por um senhor! Que gracinha! Não sei se tinha mais pena da cabrinha ou do senhor (isso até me lembra uma historinha de criança...).
Satisfeitas com a visita a  cidade, resolvemos pegar nosso carrinho para prosseguir em direção a nosso destino. Foi engraçado ver, em meio a um paredão caindo aos pedaços, um caixa eletrônico instalado em um buraco meio improvisado... Bem esquisito, para quem está acostumada a ver esses negócios todos protegidos por vidros provavelmente blindados...
A continuação da nossa viagem foi bem menos interessante que o início, pois pegamos a auto-estrada e não havia sequer um automóvel para nos distrair, pois as pessoas já deveriam estar se preparando para a festa do ano novo, encarregadas da confecção do tradicional bolo, enquanto aguardam pacientemente os “bobs” produzirem o efeito desejado na cabeleira.
Pegamos ainda um pedacinho mais rural, ao desviarmos da auto-estrada para Varadero, mas já estavamos suficientemente cansadas para nos permitirmos aquelas paradinhas para fotos.
Ao chegarmos definitivamente em Varadero, ficamos surpreendidas com o novo “ambiente” que se delineou: logo após a ponte que literalmente separa a parte turística da cidade, nos sentimos entrando em um novo país, ou melhor, um novo mundo!
O asfalto era escuro (sinal de que estava bem novo) e lisinho, sem quaisquer daqueles remendos típicos da auto-estrada; o canteiro central verdejante, estava ornamentado com lindas palmeiras e os hotéis até eram de menos mal gosto que os outros dois que nós tinhamos nos hospedado do outro lado da ilha.
Enfim, uma espécie de oásis no deserto (não era a toa que uma placa indicava um local (ou hotel, não sei bem), logo na entrada que se chamava literalmente “Oásis”.
Ao chegarmos no nosso hotel, fizemos o check-in e quase ficamos sem direito ao jantar do ano novo, pois, pelo que tudo indicava, éramos os últimos hóspedes a chegar.
Por sorte, ainda havia uma mesa de quatro lugares sobrando, a qual deveriamos dividir, em um esquema bstante socialista, com outras duas pessoas, que, por sorte (segundo a funcionária), falavam português.
Depois entregamos o automóvel, felizmente ilesas, e logo fomos procurar Lú e Felipe, que, em tese, estariam no nosso hotel. No entanto, logo descobrimos que estavam em outro Meliá (só em Varadeiro existem cinco desta rede, são literalmente sócios de Cuba, já que possuem 49 porcento do capital de cada hotel).

Depois de fumarmos um pouquinho do charuto cubano Cohiba, que achei dificil acender, até descobrir que tinha que cortar a pontinha, resolvemos, então, fazer uma surpresa e aparecer de supetão no seu hotel, margeando a praia, já que, por sorte, o deles estava próximo ao nosso.
Roubei uma cervejinha do bar do hotel deles (até parece que iam fiscalizar a cor da minha pulseirinha) e interfonamos, rezando para que não tivessem dormindo.
Lú atendeu, sem saber se falava “ola” ou “alo” e logo desceu, para nos contar as aventuras de Havana. Depois de fofocarmos bastante, voltamos para o hotel (desta vez por dentro, pois já havia escurecido) e fomos tomar um banho para nos prepararmos para o jantar, torcendo para que nossos companheiros de mesa estivessem sem fome.
E não é que eu estava falando isso na fila para Flávia, quando descobrimos que nossos “cosortes” estavam logo atrás, talvez ouvindo tudo! E o pior: não apenas falavam português, como eram brasileiros. E mais: não apenas cariocas, como moravam na Península, ou seja, nosso condomínio da Barra! Coincidência maior é impossível! O rapaz, inclusive, já morou muitos anos na região oceânica em Niterói, mas resolveu ceder à tentação de estar residir mais perto do trabalho.
Não faltou assunto no jantar comunitário, embora ele tenha sido levado à Cuba mais ou menos à força pela mulher, pois, sem saber da beleza das praias, devia achar que só encontraria barbudos por aqui. Chegou a comentar, extasiado, que a praia de Varadero nem se comparava a Buzios...
Por um milagre de final de ano, o vinho chileno era de qualidade espetacular, considerando se tratar de hotel all inclusive e o jantar foi simplesmente maravilhoso, embora a lagosta não estivesse tão macia quanto poderíamos esperar deste fruto do mar tão injustificadamente desejado por todos.
O mais divertido, contudo, foi termos sido praticamente expulsas do jantar, quando já era mais de onze horas da noite, e resolveram definitivamente apagar as luzes do restaurante, a fim de nos desestimular de continuar nossa prosa.
Quando subimos para o lobby, quase nos assustamos com vários gringos de chapéuzinho de festa e outros acessórios purpurinados pulando como crianças! Muito engraçado! Mas nem se compara ao nosso reveillon que, pelo visto, não há igual em lugar nenhum do mundo, seja pela naturalidade dos brasileiros, seja pela queima de fogos, que não deve ser sequer conhecida por aqui. Na minha opinião, sem fogos não há como se “sentir” a passagem do ano.
De qualquer forma, foi possível constatar que um ano novo iniciava, quando as pessoas começaram a gritar descompassadamente, cada um de acordo com seu próprio relógio, alguns adiantados entre outros retardatários.
Nos sentimos até um pouco discriminadas, pois a terceira idade praticamente dominava o espetáculo.
Logo depois da “virada” decidimos, então, irmos ao aconchego do nosso quarto, afinal, além de estarmos já bem altinhas, o dia tinha sido bastante difícil, com todas aquelas estradas percorridas.
01.01.2011.
Apesar de termos abusado um pouco no dia anterior, acordamos incrivelmente sem ressaca e até de bom humor.
Como não tinhamos reservado nenhum passeio, aproveitamos o dia para um belo “far niente”, lagartixando na belíssima praia em frente ao hotel.
Diferente do dia anterior, em que a água do mar já estava escura, em razão do avançar do horário, neste dia o mar estava fantástico, com aquelas típicas camadas sobrepostas de diferentes tonalidades de azuis.
A temperatura, contudo, não era das mais convidativas, embora este seja o preço que nos é imposto para evitar o risco de furacões, muito comuns no verão cubano.
No entanto, aquela paz abençoada do primeiro dia do ano estava com hora marcada para acabar: um sujeito patético com um apito pendurado no pescoço como uma coleira, resolveu se instalar exatamente entre as nossas cadeiras e aquele mar maravilhoso e começou a apitar para chamar os sedentários para acompanhá-lo em uma aulinha de aeróbica.
Como se não fosse suficiente ter que aturar aquelas pessoas poluindo visualmente a paisagem, ainda fomos compelidas a suportar a poluição sonora, já que o sujeito cismou que tinha que apitar “para dar um ritmo” à aula. Que coisa mais insuportável! Embora minha vontade fosse de voar em seu pescoço, decidi adotar uma atitude um pouco menos irracional e resolvemos simplesmente mudar de lugar, tamanha era a insuportabilidade daquele apitaço.
Para aproveitar o ambiente cubano, resolvi dar uma folheada em um livrinho escrito pelo prolixo comandante Fidel cujo título aponta na direção diametralmente oposta do que acontecerá: “A história me absolverá”.
Quando o livro foi escrito, seu autor ainda estava na cela, detido pelo “ditador sanguinário patrocinado pelos yankes”, em razão da tentativa frustrada de tomada do quartel da Moncada, em Santiago, ele poderia estar absolutamente correto ao atribuir referido título a obra. Hoje, contudo, não afirmaria com tanta convicção que os historiadores permaneceriam com a mesma opinião.
Como espécie de vingança pela perda de alguns de seus “homens” naquela tentativa frustrada, o governo de Fulgêncio Baptista ordenou o assassinato de trinta prisioneiros revolucionários, fato este que fortaleceu de forma significativa o movimento, dada a crueldade do ato (embora não haja provas de que tenha havido efetivamente uma ordem neste sentido, sabe-se que os responsáveis pelos assassinatos não sofreram qualquer tipo de punição, o que indicaria, ao menos, um aval tácito).
Todos reconhecem a grandeza da revolução, no que tange à expulsão de Fulgêncio Batista da ilha.
Este pequeno livro consistiu no discurso de autodefesa de Fidel, formado em direito, escrito enquanto permanecia detido em uma solitária, para tentar afastar a condenação de 56 anos que era pedida pela acusação. Como estava proibido de se comunicar por escrito por seus companheiros, desenvolveu uma técnica de escrita com limão, no fundo de cartas “inofensivas”, que era perfeitamente possível ler ao colocá-la contra luz de vela. Também desenvolveu outra técnica, consistente em escrever em letras minúsculas e instalar as pequenas mensagens no fundo falso de caixas de fósforos.
Apesar (ou talvez em razão) do prolixo discurso oferecido em auto-defesa por ocasião do seu julgamento, Fidel acabou sendo condenado por quinze anos de prisão (acaba logrando sair em menos de três anos, em razão da pressão popular).
Nesta ocasião ele defende a legitimidade da revolução quando o governo é ditatorial e maltrata seus cidadãos.
O mais interessante é que este longo discurso poderia perfeitamente ser utilizado hoje pelo povo como uma forma de legitimar a revolta popular contra o atual governo ditatorial.
As principais pretensões revolucionárias consistiam em transformar a Cuba agrícola e analfabeta em um país próspero. Embora o analfabetismo tenha sido, de fato, eliminado, ficamos com sérias dúvidas sobre as vantagens efetivas desta vitória.
Além de existirem muitos analfabetos funcionais, muitos cubanos com alta escolaridade são condicionados a não questionar, até porque isso implicaria certamente em uma insatisfação generalizada contra o governo.
No entanto, o enxame de propagandas políticas que ainda fazem referência a uma revolução ocorrida há mais de cinquenta anos garante a necessária lavagem cerebral de seus habitantes, dentre os quais muitos ainda acreditam que o único motivo para sua carestia consiste no embargo econômico imposto pelos yankes. Tenho certeza que mudariam de opinião ao terem conhecimento da opulência com que vivem os “comandantes” de sua ilha.
Obviamente que não tive paciência de fazer uma leitura linear deste discurso de Fidel, já que sua prolixidade consegue a façanha de irritar até a mim, que não tenho a objetividade como característica principal.
Resolvi dar um mergulho no mar, para refrescar o corpo e a mente e, como o estômago já estava clamando por atenção, fomos almoçar em um restaurante crioullo, sem, contudo, termos acesso a qualquer novidade (a refeição era um peixinho bem ordinário frito, acompanhado de batatas fritas).
Passamos o resto do dia naquela mesma ociosidade da parte matutina, tendo que “suportar” aquele mar tão azul que chegava a causar uma certa indisposição...
02.01.2011
Hoje foi o dia do passeio para Cayo Blanco, uma ilhota a uma distância de algumas milhas de Varadero.
Como não podia deixar de ser, o ônibus atrasou uma meia horinha (eles são bem conscientes no que tange ao respeito deste aspecto “cultura” nacional).
Ao chegarmos no Catamarã, nos instalamos imediatamente naquela rede que fica à frente da embarcação. No entanto, ela não parecia tão segura quanto as outras que já haviamos experimentado e esta sensação se intensificou quando mais de uma duzia de japoneses (ou qualquer coisa semelhante) se empolgaram com a nossa iniciativa e resolveram se instalar confortavelmente sobre a mesma rede.
Como não tinha a intenção de ser estraçalhada pelo motor do barco, até porque o procedimento burocrático para remoção de cadáveres deve ser suficientemente demorado a ponto de não sobrarem sequer os ossos para serem trasladados ao país de origem do corpo, resolvi não “pagar para ver” e logo busquei um cantinho mais seguro no barquinho.
A primeira parada foi a dos golfinhos. Embora não tinhamos a intenção de nadar com golfinhos mantidos em cativeiro, por termos a consciência de que eles são mantidos assim única e exclusivamente em razão dos turistas que enchem o bolso (para não dizer outra parte do corpo) de dinheiro às custas do confinamento daqueles dóceis mamíferos, não tivemos opção, já que para se chegar a Cayo Blanco incluia-se necessariamente a visita ao delfinário.
Já que fomos obrigadas a passar pelo local, não iriamos deixar de aproveitar para dar um pouco de carinho para aqueles bichinhos carentes e, então, descemos para a plataforma onde não apenas passamos a mão naquela pele hiper macia, como até demos beijinhos na boca, ou melhor, no nariz ou algo do gênero (como o bichinho é safado, beijou todos os turistas em menos de dois minutos!).
Fez também várias estripulias, como saltos ornamentais, giros fantásticos, até bater palmas para si próprio o bichinho sabia fazer. Mas tudo com uma única e “egoísta” intenção: receber seus peixinhos como “forma de pagamento”. E nós achando que são os homens que exploram os golfinhos... Estes devem pensar exatamente o contrário, por ser tão fácil agradar estes humanídeos tão bobos com umas acrobacias extremamente básicas.
Ainda antes de chegarmos em Cayo Blanco (como o pessoal gosta de enrolar nestes passeios...), paramos para fazer snorkel em um lugar perigosíssimo: no meio de um mar revolto, saltamos para ver peixinhos, mas a única coisa que eu conseguia enxergar eram os pés dos demais curiosos que resolveram aderir a aventura.
Por sorte não dispensei o salva-vidas, já que o negócio estava realmente perigoso. Mas, de qualquer forma, minha personal salva-vidas estava de olho, na hipótese de qualquer eventualidade, certamente iria me salvar (isso porque ela não tinha noção da temperatura da água).
Finalmente chegamos na ilha paradisíaca, dotada de uma enorme faixa de água cristalina, que parecia nos hipnotizar com sua beleza inebriante. Estávamos com vontade de nos perdermos naquela imensidão, bem longe do resto dos reles mortais.
No entanto, logo fomos interrompidas em nosso sonho paradisíaco, com a advertência de que teríamos que almoçar antes de podermos desfrutar da ilha. Que coisa chata! Não temos liberdade para nada...
Resolvemos seguir o itinerário, até porque não teríamos outra opção a não ser passarmos fome. Tive que suportar um almoço a base de lagosta (como eles tem mania de servir este crustácio pegajoso por aqui...) e, depois, fomos finalmente aproveitar o minguado tempo restante naquela ilha fantástica.
É impressionante como o tempo passa rápido, nos momentos em que mais desejamos que ele se prolongue infinitamente...
Para conseguirmos dar um mergulho foi necessário que caminhassemos por mais de cem metros em direção ao fundo do mar, já que antes disso a profundidade da água não é superior a altura do nosso joelho. Se fôssemos um pouquinho mais preguiçosas, acho que desistiríamos desta empreitada.
O mar é calmíssimo a ponto de ser possível ficar boiando durante horas sem sequer sair do lugar. Mas como não tínhamos muito tempo, resolvemos aproveitar para tirar umas fotinhos subaquáticas, com a carga remanescente da bateria, pois tinha esquecido o carregador no meu país de origem.
No retorno para o hotel, ainda na embarcação, quando resolvi tirar uma soneca à sombra, fui perturbada pelo capitão, que me obrigou a ficar em pé, a fim de prestar atenção em algo muito importante que teria a dizer.
Após ter toda a atenção voltada para si, parou o barco em alto mar e aumentou o som, informando que todos teriam que dançar, sob pena de serem lançados ao mar.
Eu, com todo o meu espírito esportivo, me recolhi ao meu mundo interior, como única forma encontrada para demonstrar a minha profunda desaprovação pelo incômodo causado. Tenho certeza que meu
“bico” não foi ignorado pelo sujeito. No entanto, ele não cumpriu a promessa de me jogar no mar, destino este que talvez seria mais interessante que continuar suportando aquele bando de gringos tentando dançar a “macarena”.
O sujeito chegou enfim ao único objetivo visado com tanta balbúrdia: o momento de pedir as gorjetas. Obviamente não dei nenhum centavo, até porque não podia compactuar com tamanho desrespeito a um ser humano, de ser compelido de aturar toda aquela baboseira por quase uma hora, tempo este que poderiamos ter desfrutado muito mais agradavelmente em Cayo Blanco.
Chegando no cais, fomos encaminhadas a subir em um dos ônibus da excursão, dentro do qual ficamos por mais de meia hora, sem recebermos quaisquer informações sobre o motivo de tamanha espera (como eu disse, o respeito a cultura da demora, aliada à falta de informação, é incondicional).
Tomamos um vinho bem razoavelzinho durante o jantar, mas fomos impedidas de levar para o quarto o resto do liquido que ainda havia na garrafa por “questões de segurança”, como o garçom foi “adestrado” a informar àqueles turistas inconvenientes que lhe perguntassem o motivo da proibição.
Digo inconvenientes, porque já sabiamos muito bem a razao: por se tratar de hotel do tipo all inclusive, quanto mais bebidas no quarto, mais se consome, ou seja, através desta simples equação matemática, conclui-se que a proibição acaba dando mais lucros ao hotel, ao se reduzir o consumo daquilo que lhe cabe custear.
Outra observação digna de nota consiste na inacreditável burocracia para reavermos o controle remoto do quarto, provavelmente retirado dali por algum outro hóspede que resolveu “fazer justiça com as próprias mãos” dada a ineficiência do serviço hoteleiro que representa, no caso, o “Poder Constituído Local”.
O que poderia ser resolvido com  um simples telefonema para a recepção, acabou se transformando em um enorme transtorno que poderia ter culminado com uma agressão física, caso eu não fosse uma pessoa extremamente tranquila.
Informei que o controle remoto que estava no nosso quarto no dia anterior havia desaparecido e que desejariamos que nos fosse fornecido outro controle. Depois de uns dez minutos de espera no telefone, a recepcionista informou que não possuia a chave do local onde se guardam os controles, razão pela qual o problema só poderia ser solucionado no dia seguinte, ou seja, após nosso check-out.
Pedi para me direcionarem para o setor no qual se fazem as reclamações e narrei o ocorrido. Após alguns minutos, outra pessoa retorna a ligação, informando que possuiriam a chave do local onde se encontram os controles, mas que estes não poderiam ser fornecidos, pois seria necessária a visita de um técnico! Imaginem só: um técnico para verificar qual controle é compatível! Eu teria certeza que tinha sido flagrada em uma “pegadinha” caso não tivesse em Cuba, onde todos os hotéis são controlados e administrados pelo governo.
Foi obviamente inútil minha tentativa de convencer minha interlocutora sobre a desnecessidade de um técnico, já que este só é necessário na hipótese de problemas apresentados pelo aparelho, que não seria o caso. Desisti, enfim, de investir minhas energias nesta empreitada, até porque já estava suficientemente tarde para quem acordaria no dia seguinte às 7h da manhã.
03.01.2011
Foi incrivelmente fácil pegarmos nossa cestinha de café da manhã, embora no dia anterior a pessoa responsável por avaliar a qualidade do serviço do hotel tenha nos informado que a reserva do pick-nick (como eles chamam o café da manhã para viagem) só estaria disponível até 6:45h, sem, contudo, esclarecer o que comeriam aqueles que acordassem depois deste horário e saíssem antes do início do café “oficial”, servido às 7h.
Como não podia deixar de ser, foi impossível obter uma garrafa de água mineral para levarmos, pois estas só poderiam ser pegas na recepção à noite e pela manhã não podem ser entregues no bar que funciona 24h. Claro que há muito tinha deixado de tentar entender esta lógica, até porque, caso contrário, poderia ser repentinamente acometida de uma doença mental grave.
Finalmente o ônibus da Transtur chegou após o atraso regulamentar ao qual já estávamos acostumadas (os turistas novatos chegaram a ficar preocupados, mas tratamos de acalmá-los). Não é dificil chegar a conclusão sobre a existência de uma espécie de “máfia” da Transtur, o que foi ainda mais evidenciado no aeroporto de Varadero, onde vimos não menos que vinte ônibus idênticos da mesma empresa. Não é dificil, no caso, diferenciar estes ônibus que, na realidade, pertencem ao governo e são destinados exclusivamente aos turistas, dos demais, que são extremamente escassos e cujos remanescentes permanecem em circulação exclusivamente em razão das mãos abençoadas de algum mecânico, que deveria ser santificado ainda em vida, se é que isso é possível.
A propósito, não sei se já comentei, a “carona” cuja natureza para o resto do mundo é de ato voluntário e gratuito, por aqui é obrigatória e algumas vezes remunerada. Confesso que não consegui entender muito bem a lógica, mas, dependendo da cor da placa (há vermelhas, azuis e amarelas) você pode ser obrigado a dar carona, sob pena de se sujeitar a uma multa de trânsito (e, talvez, até a algumas penalidades mais severas, como a perda do direito ao automóvel, já que por aqui eu não duvido de nada).
Muitos cubanos, inclusive, pedem carona já balançando seu dinheirinho ao vento, como forma de indicar que a carona pretendida é remunerada. E isso tudo porque o transporte público coletivo é praticamente inexistente na ilha, pelo menos para os cubanos...
Enfim, passada esta divagação, já haviamos feito o check-in para embarcar no vôo para Cayo Largo. Após um breve momento de desespero, ao vermos o povo do vôo anterior desembarcarem do avião e retornarem para a área de embarque, conseguimos obter a valiosa informação que o ocorrido derivou exclusivamente da neblina matutina, que impediu o avião de decolar.
Claro que pela lógica distorcida deles, o vôo posterior não poderia ser atrasado e nós embarcamos normalmente quando não havia mais neblina, sob os olhares raivosos daqueles passageiros do vôo anterior que foram compelidos a aguardar nossa decolagem para só então poderem embarcar novamente.
Não queria estar na pele deles, até porque já tinhamos “créditos” suficientes no que tange a “perrengues” suportados a fim de nos aproximarmos ao máximo da experiência do povo cubano, cujo sacrifício, contudo, é incomparavelmente superior a quaisquer contratempos a que tenhamos sido submetidas.
Caminhando pela pista de decolagem, pensamos que a aeronave seria igual àquelas que voamos nas ilhas do Thaiti, com capacidade para umas quarenta pessoas no máximo.
No entanto, fomos direcionadas para um avião incrivelmente pequeno, com apenas seis fileiras, o que me causou um certo congelamento na espinha, principalmente ao constatar que a empresa aérea era aquela cubana, cuja primeira sílaba sintetiza de forma particularmente incrível sua qualidade.
Cheguei a conclusão de que não valia a pena me lembrar que há menos de um ano um avião daquela companhia sofreu um acidente, sem que tenha sobrado um sobrevivente, e entrei, tentando me distrair e aproveitar aquela experiência única.
Sentamos na última fileira e, ao olharmos para trás, vimos todas as nossas malas, como se fosse um porta-malas de um automóvel.
O sujeito ao nosso lado, que não falava nem inglês nem espanhol e resolveu levar os filhos para “trabalharem” como tradutores intérpretes, sequer cabia na cadeira, de tão estreito que era o espaço entre elas.
Mas a parte mais tensa do vôo, foi o momento em que ouvimos um estalo altíssimo, como se uma das hélices tivesse se deslocado, ou qualquer coisa tão grave quanto. No entanto, o barulho foi causado por um pentelhinho que estava tentando abrir a filmadora que estava protegida por uma daquelas caixas à prova d’água! Que alívio para todos, que estavam visivelmente pálidos pelo acontecimento.
Fora esse entretempo, o vôo transcorreu tranquilo, até mais do que se esperava. Por sorte, não passamos por nenhuma turbulência e até foi possível admirar a beleza do mar daquela parte da ilha, através daquela vista aérea espetacular.
Adoramos o hotel, não apenas por ser menos brega que todos os anteriores, mas também pela parcial vista para o mar que tinhamos da nossa varandinha.
Depois do almoço, aproveitamos para descansar um pouco na maravilhosa praia em frente ao hotel, cujo mar estava até mais divertido que aquela costumeira monotonia: tinha até ondinhas para eu “pegar jacaré!).
A noite, jantamos no restaurante gourmet de comida internacional, acompanhado de um delicioso vinho chileno, ocasião em que não pude deixar de me considerar feliz por este breve retorno ao “mundo civilizado”.
04.01.2011
Acordei um pouquinho enjoada devido ao excesso gastronômico do dia anterior, o que não chegou a ser um preço elevado pelo prazer incomensurável desfrutado após dias seguidos de “privações”.
Depois do café, subimos no ônibus que nos levaria para o cais para pegar o “trimarã” para Cayo Rico. Como não podia deixar de ser, não houve qualquer tipo de comunicação, tamanha era a apatia dos responsáveis por nossa condução (parece que eles apenas “aprendem” a serem simpáticos no final dos passeios, quando chega o momento de sugerirem o pagamento de “propina”, ou seja, gorjeta).
O cais, localizado a uma distância de uns dez minutos do nosso hotel, foi construído em uma belíssima enseada, onde fomos recepcionadas por um simpático pelicano.
Nosso barquinho, o tal trimarã (o nome deriva do fato óbvio de possuir três “bases” em contato com a água, diferente do catamarã, que possui apenas duas) apresenta uma forma bem interessante, já que não é nada mais que uma espécie de uma grande canoa movida a motor, que possui mais duas bases necessárias para possibilitar a instalação de confortáveis redes para descanso sob o sol, durante o passeio.
E haja paciência! O negócio consegue ser mais devagar que um barquinho a vela... Mas o que vale é o espírito de aventura. O sol era intermitente, o que aumentava nosso prazer quando ele resolvia “sair” de trás das nuvens para dar uma aquecidinha, “embelezando” o mar, que se tornava muito mais azul.
No passeio havia incrivelmente 26 italianos, ou ítalo-parlantes (o que é quase sinônimo), predomínio este que até o final da nossa estada em Cayo Largo não conseguimos compreender (dizem as más línguas que os italianos são muito safados e que haveria uma espécie de “mercado negro” de serviços “alternativos”, mas não acredito que esta característica seja exclusiva dos italianos, embora o atual presidente da península “boteiforme” consista em um exemplo emblemático).
Após mais de uma hora de passeio, a embarcação finalmente ancorou no meio de uma barreira de corais, para que pudessemos admirar os recifes e a fauna marinha munidos de snorkel.
A Flávia nem se arriscou a mergulhar, não porque a água estivesse congelante (de fato estava razoavelmente gelada), mas apenas porque o mergulho de snorkel não é a atividade que mais lhe apetece.
Resolvi, então, fazer uma espécie de “reportagem fotográfica” da área, com curtos filminhos e algumas fotos com minha máquina, cuja bateria já dava sinais de esgotamento.
Confesso que fiquei um pouco decepcionada com a falta de peixes, já que estes seres semoventes me encantam mais que os corais. No entanto, tive que me contentar com a beleza destes últimos, sendo que alguns me lembravam um cérebro humano dissecado. É impressionante imaginar a profusão de vida contida em um negócio deste.
O único peixinho interessante que encontrei foi um cujo tamanho era um pouco maior que um palmo e que era de um tipo de azul fosforescente. Além disso, aparentava ser meio estúpido, pois enquanto nadava em sua direção para filmá-lo, ele fugia de mim, mas nunca se escondia entre os corais, como os outros exemplares de seu gênero costumam fazer.
De qualquer forma, chegou a hora de a bateria acabar (não apenas a da máquina) e resolvi, então, retornar ao barquinho. Foi quando ouvi algo como uma espécie de comparação que os italianos estavam fazendo daquele mar com Fernando de Noronha, em uma clara alusão de preferência por este último, ao menos no que tange à fauna marinha. Infelizmente, não pude dar meu parecer, mas espero ter a possibilidade de conhecer esta bela ilha um dia ainda nesta encarnação e antes que nossa espécie a destrua.
Como todos já haviam retornado e só faltava o tal do “capitão”, os demais o chamavam para que pudessemos prosseguir nossa viagem. Ao subir no barco, tive a grata surpresa de ver uma lagosta vivinha presa em seu arpão de pesca! Agora é possível entender porque eles nos “entopem” de lagosta: infelizmente é muito fácil encontrar este crustácio por aqui...
Obviamente que ele aproveitou o ensejo para fazer propaganda do produto da sua pesca (seria correto chamar assim a “caça” da lagosta, já que não se trata de peixe? – eis mais uma questão tormentosa).
Finalmente chegamos em Cayo Rico e foi aqui que tive um insigth fantástico: a expressão “cayo” significa, na realidade, uma pequena ilhota (se é que isto não seria uma redundância) que equivale, na linguagem dos polinésios, aos chamados “motus”! Como não tinha percebido isto antes!
Próssimo a Cayo Rico, há diversos outros “cayos”, como Cayo Alcatrás e Cayo Mujeres de Arena (este último foi confessadamente inspirado na famosa telenovela brasileira, como sói acontecer com muitas coisas por aqui).
Logo ao chegarmos no restaurante, tivemos uma espécie de “prévia” do que vamos nos deparar em Galápagos: dezenas de animais que deixaram de seguir o ritmo evolutivo, com nítido aspecto pré-histórico – as iguanas!
Ficamos impressionadas com a feiura destes tímidos bichinhos. Flávia tentou conter seu desespero, fingindo a maior naturalidade possível. No entanto, pude sentir o quanto ela desprezava aqueles animais, mantendo-os o mais longe possível de si, apenas por precaução.
Toda aquela espécie de “pelanca” pendurada no seu “papo” serve para assustar seus possíveis predadores, além dos próprios “colegas” da mesma espécie que vierem intimidá-la, seja para roubar sua presa ou sua fêmea – o que dá quase no mesmo.
No mínimo indício de risco, a iguana enche aquele papo de ar e transfoma aquilo em uma imensa bolha, capaz de aumentar consideravelmente seu tamanho, a fim de amedontrar o rival. Por isso, os machos possuem aquela parte mais elástica que as fêmeas, já que, como todo o reino animal (o que obviamente inclui os seres humanos), os machos são muito mais brigões que as fêmeas.
Embora sejam portadoras de uma aparência física aterrorizante, as iguanas são extremamente tímidas. Ao nos aproximarmos lentamente delas, elas permanecem estáticas até uma certa distância de segurança. Uma vez ultrapassada esta pelo potencial predador, elas partem em disparada, com uma agilidade que chega a impressionar.
Quem chegou mesmo a gostar da experiência com as iguanas foi uma italiana alcoolizada que estava visivelmente exaltada com a presença destes répteis, e parecia não sossegar enquanto não conseguisse pegar uma no colo; como a empreitada era claramente impossível, a mulher não deixou os bichinhos em paz, embora tenha conseguido no máximo segurar o rabinho de uma ou de outra.
Uma vez passada a fase desta experiência, esperamos pacientemente o almoço, que foi decepcionante: como pedimos para não colocarem a “salsa” de lagosta no macarrão, tivemos que suportar aquela massa desenchavida. O que salvou foi o peixinho, que estava bem palatável.
Depois do almoço, aproveitamos para fazer um passeio “exploratório” até a pontinha da ilha, onde há um canal que faz fronteira com o Cayo Albatroz.
Aquela parte consegue ser ainda mais bonita do que onde fica localizado o restaurante, seja pela paz que a ausência das iguanas proporciona, seja pelas fantásticas faixas de tonalidaes de azuis causadas pelas súbitas diferenças de profundidade.
No retorno, fui literalmente tragada até o joelho por uma areia movediça. A sensação não foi de todo desagradável, embora tenha quase entrado em “estado de desespero”. Mas a única preocupação grave foi com a minha havaiana, pois dificilmente encontraria outra para comprar por aqui.
Por sorte, consegui sair ilesa e sem qualquer tipo de prejuízo material. Claro que me lembrei de todas as dicas de como se livrar de uma areia movediça, mas sinceramente não acho que esta tenha sido das piores.
Sentimos um pouco de frio no retorno, já que o sol continuava com aquela intermitência relativamente incômoda. No entanto, o cansaço aliado à algumas cervejinhas foi suficiente para me convencer a deitar com a cabeça apoiada na boia e tirar uns bons cochilos.
Só acordei quando chegamos finalmente em uma piscina natural, em frente a Cayo Mujeres de Arena, onde aguardamos pacientemente uma “visitinha” do sol para embelezar a cor do mar (sem ele, este permanece com um incômodo monocromático azul escuro).
Mas, por sorte, fomos agraciadas com a visita do astro rei e pudemos apreciar, ainda que por alguns instantes, a beleza daquele mar cristalino. No entanto, não houve ser humano suficientemente audaz a ponto de nele mergulhar, já que o máximo que se conseguiu foi ir em direção à “piscina” com a água até os joelhos para se tirar fotos e nada mais. Afinal, a temperatura da água aquela hora da tarde não era nada convidativa.
À noite infelizmente não pudemos desfrutar do restaurante gourmet novamente, já que aqueles condicionados a reserva só podem ser utilizados uma vez por semana. Nos contentamos, então, com o restaurante típico crioullo, e aproveitamos para pedir uma sopa de frijoles dormidos, que não chega nem aos pés do nosso feijãozinho temperado com alho. Em seguida, comi o tal do “lomo ahumado” (lombo defumado), mas nem estava grandes coisas.
Fomos dormir saudosas do restaurante do dia anterior.
05.01.11
Depois do café da manhã, fomos surpreendidas pela presença do trenzinho que nos conduziria à praia serena, pois parecia que ele estava a nossa espera (todo dia às nove da manhã sai um trenzinho para conduzir os hóspedes do hotel gratuitamente à praia mais linda da ilha, no entanto, hoje haveria um “pequeno” imprevisto).
Perguntei para o condutor se poderiamos ingressar no trem, ocasião em que ele nos deu a fantástica notícia de que o trajeto para a praia estaria interditado em razão de um buraco e que estariam aguardando que o problema fosse resolvido pelas “autoridades” locais.
Ficamos imaginando quantos meses esta restauração poderia durar e chegamos a conclusão que seria muito mais eficaz alugarmos uma motocicleta do tipo vespa.
Ocorre que mais de vinte turistas tiveram a mesma brilhante idéia e já se encontravam na fila de espera do funcionário responsável, o qual estava, obviamente, atrasado.
Como não poderiamos saber sequer se ele chegaria e quase adivinhando que não teriamos sofreguidão para aguardar todos os trâmites burocráticos que envolveriam os contratos daqueles que estavam a nossa frente, resolvemos ter outra “brilhante” idéis: íamos a pé.
Embora entre os “locais” houvesse uma pequena divergência em relação a quilometragem a ser percorrida, já que uns mencionavam dois quilômetros, enquanto outros faziam referência a seis ou oito. Preferimos acreditar nos mais otimistas e iniciamos nossa empreitada sob um sol escaldante (conhecem aquela lei de Murphy? Pois é, hoje o sol não estava nem um pouco intermitente como no dia anterior...).
Não precisamos de nem meia hora para quase desistirmos do nosso objetivo. Flá estava derretendo sob o sol, e certamente teria tido uma ensolação, caso insistíssemos na nossa teimosia.
Ela chegou a mencionar que aquilo seria um programa de índio, o que me deixou um pouco chateada em razão da agressão gratuita aos meus antepassados. Afinal, um índio nunca faria um programa desses...
Por sorte, havia alguns veículos automotores passando pelo local, o que nos fez decidir vivenciar mais uma experiência típica cubana: pedir carona. Depois de umas quatro ou cinco tentativas infrutíferas, tivamos a felicidade de conseguir que uma alma caridosa permitisse que sentássemos no banco do carona de uma van e, assim, conseguimos chegar até o local do tal buraco, do qual, contudo, este não passou.
De qualquer forma, pelo nossos cálculos, já tínhamos “economizado” uns três quilômetros, o que não era nada mal, considerando que já se aproximava do meio dia.
Após mais uma breve caminhada, vimos um ônibus-taxi (por aqui os mircrôonibus que fazem uma espécie de “lotada” são chamados de táxis por um conveniente eufemismo) e acenamos na esperança de que nos permitiria embarcar (o anterior havia passado direto, nos ignorando de forma inclemente).
Como a roda da fortuna estava, agora, inclinada a nosso favor, o bondoso motorista resolveu parar e nos levar, como sardinhas enlatadas, até o destino final, ou seja, a tal praia Serena.
Antes desta praia, passamos pela tal praia Paradiso, que faz jus ao nome por ser dotada de belíssimas lagoínhas na areia, que refletem o sol e dão um charme especial ao local.
No entanto, tivemos que conter nossa curiosidade e permitir que o “táxi” nos levasse até a praia mais distante, pois tinhamos certeza que não conseguiriamos fazê-lo exclusivamente com os nossos sofridos pezinhos.
Ao chegarmos finalmente na Serena, pagamos o preço da passagem (pagaríamos até dez vezes aquele valor), agradecemos ao “chofer” e fomos diretamente ao bar para comprar o líquido mais precioso da face da terra, que, nestas condições, só poderia ser um: água.
Após satisfeitas nossas necessidades mais elementares, fomos curtir um pouco o mar, não sem um certo pesar pela longa faixa de areia que o dista do bar.
Nós, contudo, não tinhamos qualquer legitimidade para reclamar, até porque economizamos muito mais que meros oito quilômetros, pois a distância percorrida pelo ônibus mais parecia de oito léguas (alguns filósofos dizem que a realidade não existe, o que importa é a sensação que ela nos transmite).
O mar, como não podia ser diferente, era fantástico. No entanto, estava bravo demais para fazer jus ao nome dado à praia. Mas a parte mais bela da praia, que a eleva a categoria de 1ª colocada entre todas as da localidade e, talvez, de toda Cuba, é, na realidade, as enseadas às margens à direita.
Fomos caminhando até o local, sem muita expectativa, até nos depararmos com imensas “piscinas” translúcidas, nas quais dava vontade de deitar e descansar por toda a tarde (não fosse a temperatura mais baixa do que nós, brasileiros fãs do nordeste, estamos acostumados). Cheguei a pensar que até suportaria um furacãozinho se este fosse o preço a pagar por curtir aquela lagoa em pleno verão cubano.
Depois de “cansarmos” de tamanha beleza e atendendo a solicitações urgentes de nosso por vezes abandonado estômago, fomos fazer uma “boquinha” no restaurante do bar, que, diga-se de passagem, não tinha nada que valesse a pena.
Comemos apenas uma carninha (exclusividade dos restaurantes oficiais do governo) e, antes mesmo do fim da refeição, foi possível constatar uma aglomeração de pessoas em torno de algo que, a princípio, deveria ser interessante.
Curiosa, como todo ser humano, fui verificar o que estava acontecendo: estava prestes a começar um show com os pobres golfinhos. Ali a maldade era ainda maior, pois o espaço em que eles ficam confinados é absurdamente ínfimo (menos de uns cinquenta metros quadrados...). Depois não se entende por que um mamífero aquático mata uma treinadora, em um famoso parque norte-americano. É o equivalente a trancafiar um ser humano em uma banheira de hidromassagem (sem a hidro, obviamente).
Enfim, curtimos mais um pouquinho da praia Serena e depois pegamos o táxi-lotação para a praia Paradiso, não sem antes nos informarmos sobre o horário do último táxi, já que não seria nada interessante retornar tudo aquilo a pé, na escuridão.
Aproveitamos um pouquinho esta outra praia, que apenas se distingue da anterior pelas belas lagoas a que me referi anteriormente, e pegamos o penúltimo “táxi” (não queriamos arriscar) para o hotel.
Ao chegarmos, fomos diretamente falar com o representante da Cubatour que, contudo, ainda não tinha a informação sobre o horário do nosso vôo, não sabendo sequer dizer se  seria pela parte da manhã ou à noite (por sorte, já estavamos “calejadas” e isso não nos surpreendeu). Apenas por volta das oito da noite é que fomos informadas que o vôo sairia pela manhã, o que nos proporcionou uma certa alegria, pois teriamos mais um dia livre em Havana, local que estávamos ansiosíssimas para conhecer, principalmente por não ter podido sequer sentir o “cheirinho” na chegada.
06.01.11
Chegamos cedíssimo em Havana, a ponto de quase podermos “filar” o café da manhã do hotel.
O calor estava escaldante, então fomos no quarto apenas para colocar a bermuda e procurar o transporte mais acessível para “Habana Vieja”, primeiro destino que elegemos para conhecer.
Logo vimos na rua os famosos “coco-taxis” amarelos, que são espécies de motocicletas, com um acento traseiro que acomoda duas pessoas, o qual é protegido por uma espécie de material cujo formato é parecido com o de nossos orelhões.
Embora o valor informado pelo primeiro chofer da fila tenha me cheirado excessivo, decidimos não questionar e nos fazer de bobas para não nos aborrecer, afinal, já estávamos cansadas demais e queríamos apenas curtir aquela cidade cuja visita havia sido ansiosamente aguardada.
Pedimos para ir a “plaza nueva” onde situa-se a famosa Catedral de São Cristóvão, com suas torres assimétricas (todos os guias turísticos ressaltam esta característica que talvez não tivesse sido percebida por mim sem a advertência anterior).
Diz-se, também, que a estátua de São Cristóvão teria tido parte da coxa amputada, já que era alta demais para passar pela porta da entrada da Igreja. No entanto, não pude constatar qualquer desproporção, até porque ele poderia muito bem ter a mesma característica que minha mãe atribui para mim, qual seja, ser “mignon” (pessoa com membros proporcionalmente mais curtos em relação ao tronco).
O que me deixou mais feliz foi o aviso de que seria possível subir a torre mediante o pagamento de um CUC. Nem pensei duas vezes: compramos os tíckets e fomos enfrentar o desafio.
Após certa hesitação, consegui convencer a Flá de subir (o negócio é meio estreito e escuro, o que pode causar certa fobia) e tivemos uma bela vista “aérea” da praça. Infelizmente (ou felizmente para os mais preguiçosinhos) a torre não era alta o suficiente para permitir que admirássemos toda a cidade.
Como já estava se aproximando do meio dia e nosso sistema digestivo fazia questão de exigir atenção, pois o café da manhã foi ingerido mais cedo que de costume, fomos diretamente para o local que, talvez, seja um dos pontos turísticos mais conhecidos de Havana: a Bodeguita del Medio, onde o boêmio do Hemingway tomou bons mojitos.
Como ainda não era meio dia, o restaurante não tinha aberto, então resolvemos visitar o local onde se hospedou um famoso escritor cubano, Alejo Carpentier, e que serviu de inspiração para uma de suas obras, “El siglo das luces”, a qual, obviamente, quis adquirir.
Aquela casa pertencia a uma das poucas crioullas ricas de Cuba, tendo sido posteriormente transformada em uma espécie de pensão. Hoje hospeda a fundação destinada a promover a difusão das obras do escritor homenageado.
Retornamos para a Bodeguita, que fica logo ao lado, e obviamente não pudemos resistir em experimentar um mojito, a fim de atestar se o tal do Hemingway teria realmente bom gosto.
É divertidíssimo ver aquele bando de turistas que visitam a bodega, às vezes só para olhar e tirar foto, e outras para experimentar o tal mojito, que, diga-se de passagem, não tem nada de especial em relação a todos os outros que experimentei pela ilha. Ao contrário, achei até um  pouco sem açucar, o que me fez solicitar ao barman que acrescentasse mais e causou, curiosamente, um profundo espanto nos demais fregueses, que arregalaram os olhos como se eu fosse uma extraterrestre: imaginem, criticar o “melhor” mojito do mundo! Como as pessoas são influenciadas pela propaganda... Não é a toa que Fidel está até hoje no poder.
Na realidade, acho o mojito brasileiro muito melhor, pois em Cuba eles não tem o costume de amassar a folha de hortelã, o que acaba deixando a bebida um pouco sem graça. Só no último dia que acabei tendo a brilhante idéia de pedir para o garçom amassar a hortelã, solicitação esta que, embora tenha sido acatada com uma certa estranheza, foi elogiada por um casal de americanos que divia a mesa conosco e teve que reconhecer que o mojito “a la brasileira” era, de fato, melhor.
Terminado o mojito, tiramos algumas fotos no bar mais famoso de Havana e fomos, finalmente, convidadas a entrar no restaurante, cujo acesso se dá através de um corredor estreito ao lado do bar.
O que mais chama a atenção no restaurante é a quantidade de nomes nas paredes (mal pudemos encontrar um lugar para registrar a nossa presença). Há também inúmeras fotos, de diversas personalidades que já passaram pelo local. Diferente do que muitos podem pensar, não foi só o Hemingway que frequentava o estabelecimento, mas até Salvador Allende, Nat King Cole, entre muitos outros cujo nome não me recordo, já passaram por lá.
Nós estávamos, contudo, mais interessadas no cardápio do que nos ilustres que já se sentaram próximo a nossa mesa. Foi com muita satisfação que vislumbramos os “frajoles dormidos”, não apenas pela saudade que estávamos deste prato tipicamente brasileiro, como também para confirmar minha tese – nem sempre aceita sem controvérsia – de que o feijão do dia anterior é sempre melhor.
Pedi a tal da ropa vieja (uma espécie de carne assada desfiada com molho de tomate), que, embora já tenha experimentado em um daqueles hotéis “mequetrefes” que nos hospedamos, não podia deixar de fazê-lo em um restaurante que poderiamos qualificar de “renomado”.
O prato principal estava bem razoavelzinho, mas nos decepcionamos com a falta de alho nos frijoles, pois não parece que este tempero não é muito disseminado por aqui. A banana madura frita, que substui a batata frita, por ser um produto nacional ao qual a população tem melhor acesso, também não era das melhores. Só depois viemos descobrir que a verde frita é muito melhor, a ponto de ser dificil distingui-la daquelas batatinhas chips.
Depois de abocanharmos um flan de sobremesa (que nada mais é que nosso pudim), pedimos um pilot emprestado para assinarmos na parede. Se qualquer dia alguém passar por ali, basta olhar na parede de trás da cafeteira, em uma altura de aproximadamente um metro e meio, que será possível confirmar que realmente estivemos por ali em 2011.
O próximo destino de nossa jornada seria a Plaza de Armas, a uns dois quarteirões dali. Há uma feira permanente de livros usados, muito útil, já que o racionamento não poupa nem a edição de livros. Dizem, inclusive, que o racionamento de papel é o principal argumento utilizado por Fidel para proibir a propaganda anticomunista, já que este item de preciosidade ímpar deve ser prioritariamente utilizado na fabricação de livros escolares.
O que mais me impressionou nesta feira, contudo, foi a facilidade de se encontrar o livro que se procura. Os vendedores ambulantes (todos possuem autorização do governo e provavelmente pagam um valor significativo para tanto) têm uma excelente rede de comunicações entre si.
Se o sujeito para o qual você pediu o exemplar não o possuir naquela ocasião, ele certamente o conseguirá com um de seus colegas instalados ao redor da praça, a não ser que se trate de livro que integre a “lista negra” oficial, mas aí seria mais fácil consegui-lo na Indonésia ou em qualquer outro país do mundo exceto Cuba.
Embora não tivesse a intenção de conseguir qualquer livro de autores não cubanos, pude perceber que seria uma empreitada dificilima.
Logo depois de providenciar o “Siglo de las Luces” daquele autor cuja fundação visitei (Carpentier) e um livrinho de José Marti (este não poderia faltar!), Flávia resolveu dar uma “estancada” no processo, antes que eu pagasse excesso de peso de bagagem.
Cada vez sou mais adepta da idéia de se instituir uma espécie de “isenção”, no sentido de proibir que as empresas aéreas contabilizassem o peso de livros de autores nacionais, como forma de estimular a cultura local... Mas nenhum governo seria louco o suficiente (ou seria?) porque sempre haveria o risco de existirem várias Júlias, o que poderia implicar em um acidente aéreo.
Terminada a divagação, tiramos algumas fotos com o monumento central da pracinha, em homenagem a Céspedes, líder da independência cubana contra a colonização espanhola e, em seguida, fomos visitar o Templete, na frente do qual há uma árvore centenária onde foi celebrada a primeira missa de Havana.
Há uma crença atual que se pode fazer um desejo e girar três vezes em volta da tal árvore. E, ao fim, se desejar, pode-se deixar um “trocadinho” para ela (óbvio que a árvore faz apenas o papel de uma espécie daquilo que conhecemos como laranja!).
Resolvemos “pular” esta parte e compramos um ingresso para visitar o tal templete, sem, contudo, nos preocuparmos em investigar a etimologia da palavra (templete = templo pequenino).
Só depois de a responsável abrir a porta de entrada é que nos demos conta do que fizemos: pagamos para conhecer um local cuja área não é superior a seis metros quadrados!
Passado o desapontamento, com uma pontinha de remorso por termos nos sentido enganadas, acabamos nos contentando com a interessante explicação fornecida “gratuitamente” pela simpática senhora sobre os três (relativamente a área) imensos afrescos, retratando a primeira missa e a fundação da cidade.
Terminada a explanação, nossa guia sugeriu que visitássemos a menor rua do mundo, situada nos fundos do templete (que deve ser igualmente o menor templo do mundo).
Em seguida, visitamos a parte externa fortaleza que acabou não sendo útil aos seus propósitos, já que não foi construída em uma posição estratégica. Ela resgata no imaginário coletivo (imagino eu) aquela idéia de fortalezas medievais, cujo acesso se dá sobre uma ponte levadissa sobre um lago que outrora deve ter sido “povoado” por jacarés.
A fortaleza é “coroada” com uma Giraldina, eleita a símbolo da cidade. Ela indica, para os viajantes, os pontos cardeais. Atualmente sobre a torre há apenas uma réplica, enquanto a original de bronze encontra-se dentro do museu.
Em seguida, visitamos o Palacio de los Capitanes Generales, igualmente situado em frente a praça de armas. Só no dia seguinte é que viemos descobrir que o museu da cidade, que tanto procurávamos, é exatamente o instalado no referido palácio.
E, durante a visita a este museu, diversas vezes fomos abordadas pelas senhoras que trabalham como “vigias”, mas que também fazem “bicos” de guias de turismo. Todas querem te explicar um pouquinho sobre a sala visitada e não admitem a possibilidade de você querer descobrir por si só (ou simplesmente sequer estar interessada em determinada sala!).
No final, já não tinha mais moedinhas, pois fica muito chato não oferecer nada depois daquela explicação nada econômica.
Uma das personalidades que não podiam faltar no museu era o onipresente José Marti. Uma das guias nos informou que a famosa musica popular “guantanameira” foi inspirada em um de seus versos. Depois de vermos outros guias pela cidade fazendo idêntico comentário, ao mostrar a estátua deste ícone nacional, que lutou arduamente pela independência de Cuba e escreveu dezenas de obras, pude imaginá-lo se remexendo no túmulo por ser lembrado exclusivamente em razão de um verso que inspirou referida música popular!
Após esgotar a Plaza de Armas, resolvemos descer a popular calle de oficios, observando as típicas fachadas dos prédios antigos, cuja sensação foi de verdadeiro filme de ficção científica em que o protagonista volta ao passado.
Um pouco antes de chegarmos a Plaza de San Francisco, nos deparamos com diversas pessoas fantasiadas, o que nos levou a acreditar que por aqui teria uma espécie de carnaval fora de época.
Mas acabamos obtendo a informação, não tão fidedigna, que se tratava de festa de reis, afinal, era seis de janeiro. No entanto, os trajes utilizados remetiam mais às tribos africanas que a qualquer festa cristã.
Por aqui há, na realidade, uma espécie de sincretismo religioso, em que dificilmente conseguimos distinguir uma festa “pagã” de uma “cristã” (isso partindo do equivocado pressuposto de que a religião africana não é digna deste substantivo). Há, inclusive, casos em que o dia de um orixá da santeria (religião afro-cubana) é comemorado simultaneamente que o de uma santa da igreja católica e todos os fiéis se dirigem à mesma igreja destinada àquela santa para homenageá-la. E o mais impressionante é que todos se relacionam muito bem: há muito o que se ensinar para aquele povo do oriente médio...
Em seguida fomos em direção ao museo del rum, para fazer um tour que explica todo o processo de fabricação. A Flávia não pode conter sua impaciência quando percebeu que a guia iria iniciar sua explanação pelo aspecto mais lógico: plantação da cana de açucar. Estava mesmo engraçado como os gringos ouviam com atenção todas aquelas informações sobre a cana, como se fosse coisa de outro planeta!
Passada esta fase inicial, vimos uma maquete do engenho e a guia nos explicou que o açucar mascavo é separado do melaço por decantação e este é levado para destilaria, onde acrescenta-se fermento ao spirit (demoramos para chegar a conclusão de que spirit é o rum puro). Depois eles separam vários tipo de rum, para envelhecimento de três, sete e quinze anos. A pior parte do tour é a da degustação, pois eles só dão o de três anos para nós, reles mortais (o negócio é forte para burro!).
Diferente do que imaginávamos, não saímos “chapadas” do tour, então foi possível continuar o passeio até a casa de José Marti. Depois de vermos tantas estátuas, fotos e figuras suas por Cuba, chegamos a conclusão que seria um desprestígio não visitar seu museu.
O passeio até lá foi bem interessante, pois saimos um pouco daquela rota turística oficial. Nesta, as casas, embora antigas, ainda são dotadas do mínimo de dignidade, pelo menos é o que as fachadas nos induzem a crer.
Já nesta parte mais isolada da cidade, por onde não se costuma passar turistas, as casas estão literalmente despencando, sem qualquer tiop de conservação.
No entanto, a impressão é que os cubanos se acostumaram com esta situação, até porque não tem qualquer paradigma para servir de exemplo  e insuflar algum descontentamento (as telenovelas brasileiras, embora muito comuns, são tão diferente da realidade deles que não se poderia sequer tentar fazer uma comparação – fato este que se aplica igualmente ao distanciamento da nossa realidade).
A tranquilidade deles, contudo, é realmente invejável. Em pleno centro da cidade, nos sentimos em uma espécie de cidade do interior, com aqueles velhinhos debruçados na sacada do segundo ou terceiro andar do prédio, assistindo de “camarote” a vida cotidiana de seus conterrâneos.
Outros, porém, não necessariamente tão idosos, mas igualmente tranqulios, preferiam se postar diante da soleira da porta para “jogar conversa fora” com seus vizinhos.
Como a curiosidade, por ser íntrínseca ao ser humano, muitas vezes é irresistivelmente mais forte que padrões éticos estabelecidos socialmente, não pude resistir de dar umas espiadinhas no interior das residências, sendo possível constatar que a situação narrada por muitos é ainda menos pior que a própria realidade.
Passamos, também, por uma área onde aparentemente já existiu um prédio que é aproveitada pelos jovens para praticar seu esporte favorito: beisebol. E a falta de um taco de alumínio, ou bola fabricada para tal fim, não impede que eles brinquem com um pedaço de pau utilizado como taco e pedras fazendo as vezes da bola. Devem até ser mais atentos que os demais, pois uma “bolada” na cabeça pode vir a ser fatal...
No caminho, passamos por umas três igrejinhas que estavam igualmente mal conservadas, o que nos levou a crer que seria proposital, a fim de não “destoar” do ambiente geral.
Quase mortas de tanto caminhar, chegamos finalmente no Museu de José Marti o qual, contudo, estava em restauração. Foi apenas aí que concluímos que Havana inteira estaria em restauração e que deveríamos retornar uma outra vez para visitarmos tudo aquilo que fomos impedidas em virtude das tais restaurações.
Aproveitamos para visitar a estação de trem (ferrocarril), cujo prédio é admiravelmente belo, mas é notória a necessidade de uma restauração (ou, pelo menos, uma limpezinha).
Logo após vimos uma parte da antiga muralha de Havana, preservada apenas para interesse histórico (depois descobrimos vários “pedaços” da muralha pela cidade, como, por exemplo, próximo ao Museo de la Revolución).
Apesar de mortas de cansaço, resolvemos vencer este obstáculo natural e retornar tudo o que andamos até ali, em direção a Plaza de Armas, para tomar um caldo de Guarapá (caldo de cana, servido com ou sem rum, dependendo da perferência – ou determinação genética – do freguês).
No retorno, passamos pela Plaza Vieja (que antigamente era conhecida como Plaza Nuova, mas acabou sendo rebatizada ao ser substituída pela Plaza de Armas como ponto principal da cidade).
Ao chegarmos finalmente no bar onde se anunciava a venda de Guarapá, fomos surpreendidas negativamente com a informação de que a máquina estava quebrada (como não previmos esta possibilidade!) e tivemos que nos contentar com uma Bucanero mesmo (cerveja local cujo nome foi atribuído em “homenagem” a piratas franceses que costumavam “visitar” a ilha).
Para retornar ao hotel, não conseguimos resistir à idéia de pegar um Cocotaxi. Logo depois nos arrependeríamos, pois o vento frio do fim da tarde maltratando nossa cútis estava impiedoso...
Tentamos reservar o paladar “La Guarita” para aquele dia mesmo, mas fomos informadas que tal empreitada seria “impossível”. Só teria disponibilidade para dali a dois dias... Por sorte, conseguimos fazer a reserva em um outro paladar bem aconcheantezinho, conhecido como “El Gringo Viejo”.
No entanto, não aconselhamos que se vá sem alguém que conheça o local, pois é praticamente impossível se deduzir que há um restaurante ali, já que em nada se distingue das outras residências comuns. Na realidade, a atividade dos paladares foi recentemente autorizada pelo governo e permanece sendo uma espécie de restaurante ou pensão oferecido dentro de casas particulares difíceis de serem localizadas sem uma indicação ou auxílio.
De qualquer forma, a impressão que nos passa é que o governo tem que se cuidar, para manter o padrão de qualidade nos restaurantes oficiais (que são todos os outros), pois os particulares estão lhes superando tanto em preço quanto em qualidade.
07.01.2011
Resolvemos estender o descanso até um pouco mais tarde, para nos recuperarmos do dia anterior, em que conhecemos quase Havana inteira em apenas um dia.
Hoje o dia seria destinado a conhecer o local conhecido como “Centro Havana”, contíguo a Havana Vieja por onde passamos no dia anterior, e onde localiza-se o famoso capitólio, que nada deixa a desejar para aquele de Washington (na realidade, até Fidel deve ter muita afeição por ele, já que por mais antiamericano que seja não ousou implodi-lo).
Pedimos que o taxista (desta vez não pegamos o cocotaxi) nos deixasse na fábrica de charutos partagás. Advertência: não se pergunta para nenhum cubano onde se pode obter charutos, a não ser que tenha interesse em obtê-los no mercado negro, já que todos conhecem pelo menos uma pessoa que vive disso.
Ao fazermos tal solicitação, os olhos do taxista brilharam e ele começou a explicar as vantagens de comprar charutos com seu irmão, que trabalhava na fábrica, mas vendia bem mais barato. E, ao mesmo tempo, nos advertiu dos riscos de “comprar com qualquer um”, já que havia muitos charutos falsificados no mercado.
Depois desta breve explanação, nos informou que seu irmão venderia pelo preço equivalente a um terço ao do mercado oficial e que ele poderia garantir que eram autênticos, já que seu irmão “pegava” na própria fábrica.
Lhe perguntei se o seu irmão recebia os tais charutos como espécie de pagamento ou “regalo”. Ele falou que até recebe, mas que o maior volume é obtido mesmo pegando escondido! Fiquei chocada com a naturalidade e orgulho que ele narrava esta prática criminosa do irmão. Só depois de muito pensar sobre isso é que cheguei a conclusão que afinal isso não é tão grave, se imaginarmos que o “dono” da fábrica é o próprio governo e é este quem mantém a população em um grave estado de miserabilidade, a ponto de não restar muitas alternativas para sobrevivência com o mínimo de dignidade.
Não pudemos acompanhar o processo de fabricação, pois os artesãos estavam de férias coletivas. Nos contantamos, então, com uma visita a loja, que estava insuportavelmente lotada, o que impediu que qualquer vendedor fosse capaz de nos auxiliar.
Decidimos postergar nossa aquisição assim que descobrimos que a loja abriria no fim de semana (apenas a visitação à fábrica é que não é permitida).
Fomos em direção ao Capitólio, mas não pudemos visitá-lo pois, como toda Havana, estava em restauração. Novamente nos contentamos apenas com fotos da parte externa, sendo que uma delas foi tirada por um profissional: havia um lambe-lambe na frente do Capitólio, que não apenas tirava aquelas fotos com sua câmara escura, como também fazia “photoshop”, ou seja, montagem da escada com a cúpula do prédio, pois não “cabia” tudo em uma foto só!
Tampouco não pudemos visitar o Gran Teatro Nacional, mas, nesse caso, foi por uma boa causa (nos outros a restauração não poderia ser reconhecida como “boa causa” pois não nos beneficiaria diretamente...): estava havendo um ensaio do Ballet Nacional, para a apresentação de “cascanueces” (só depois de algum tempo me dei conta de que se tratava do quebra nozes!). Compramos dois tickets para a apresentação de domingo e nos divertimos com a forma pela qual o balconista fez a reserva dos assentos: anotou em um grande mapa de papel com as cadeirinhas aquele correspondente a nossa aquisição! Como é pré-histórico isso!
Prosseguimos nosso tour pelo passeio del Prado, que lembra longinquamente a Calle de Las Ramblas, em Barcelona. Tivemos oportunidade de ver crianças fazendo aulinhas de educação física – havia mais de uma dúzia de escolas primárias só nesta rua!
Alguns proprietários de imóveis da rua ofereciam o seu próprio em troca de um outro, confirmando o que já sabíamos: por aqui a compra e venda de imóvel é proibida, só se admitindo a troca.
Chegamos finalmente no Malecón, em um dia abençoado com a “bravura” do mar, que molhava todos os imprevidentes que passavam pelo local.
Depois de relaxar um pouquinho em contato com aquela vista deslumbrante de Havana, visitamos a Plaza de la Revolución, onde há um belíssimo monumento em homenagem a Maximiniano Gomes, herói da independência.
Logo vimos o Museo de la Revolución, nome este que seria mais adequadamente substituído por Museo del Comandante, ou simplesmente Fidel Castro, já que todas as informações dizem respeito a ele, durante o período histórico que vai desde antes da revolução (1959) até 1990. Inexplicavelmente, não há qualquer referência ao chamado Período Especial (o arrocho econômico instituído após a queda da União Soviética, principal financiador do regime cubano), nem qualquer referência ao declínio do regime, como se a “revolução” tivesse parado no tempo.
Outro fato digno de nota é a circunstância de Fidel sempre fazer referência a Fulgêncio Batista como ditador, sem, contudo, esclarecer qual o título que deve ser reservado para si, por estar tantos anos no Poder, sem que haja qualquer alternância (todos sabem que Raul é apenas uma espécie de fantoche).
Há uma parte externa ao museu dedicada ao memorial do Gramna, navio afundado em uma das tentativas frustradas de derrubar o ditador Fulgêncio Batista. O que mais me impressiona é que eles parecem valorizar ainda mais as batalhas nas quais foram derrotados, como esta ou o ataque a Moncada, do que aquela em que foram definitivamente vitoriosos, por entender as outras como uma espécie de aprendizado necessário para viabilizar a vitória final. Não sei se nós, brasileiros, teríamos este mesmo desprendimento em relação a nossas derrotas...
Quando estávamos na cafeteria do museu, encontramos o nosso companheiro de infortúnio no famigerado vôo de Caracas para Havana. Quase não o reconheci, não fosse ele chamar a atenção para sua presença, pois estava sem aquela típica boina que nunca havia tirado da cabeça.
Encurtei o assunto, para evitar me lembrar daquela mini “tragédia” e, depois de nos despedirmos, fomos para o Museu Nacional de Belas Artes, para conhecer um pouco das artes plásticas cubana.
Consegui tirar apenas uma foto de uma pintura que retratava a sociedade cubana provavelmente do século XVIII ou XIX, apostando na loteria. Fui severamente advertida e resolvi não arriscar outras, para não chegar ao cúmulo de ser expulsa, situação limite esta que já suportei quando era mais jovem, em alguns museus europeus que mantém essa proibição medieval.
Algumas obras de arte são espécies de plágios de outras mundialmente conhecidas, como aquela de Andy Wharol com várias cópias coloridas do rosto de Marilyn Monroe. A originalidade, contudo, está no sujeito da obra que não poderia ser outro senão o próprio José Marti!
Outra instalação bem interessante foi um mapa mundi em feito de pequenos pedaços de madeira em formato idêntico a ilha de Cuba. Nem preciso dizer que denúncia está implícita aí...
Quando desciamos a escada do museu, toda envidraçada, vimos um prédio de um estilo diferente, que a Flávia logo deduziu que seria o da extinta Bacardi.
O prédio é no estilo art noveau, ou qualquer coisa do gênero, suficiente para se distinguir entre os prédios da redondeza. Pretendiamos entrar no prédio e fazer uma espécie de tour guiado, mas ficamos decepcionadas ao descobrir que não há visitação, já que há apenas escritórios.
Já sabíamos que a Bacardi era, até a revolução, a maior e mais importante produtora de rum do mundo. No entanto, com a nacionalização das empresas privadas, o prédio foi estatizado e os sócios, refugiados nos EUA, conseguiram na Justiça o direito de permanecer explorando a marca, em detrimento do governo cubano, que pretendia manter esta prerrogativa. A solução foi, então, criar uma produtora paralela, hoje chamada Havana Club e cuja marca é ostensivamente divulgada pelo governo, que tem plena consciência da importância tanto da propaganda política, quanto do marketing propriamente dito.
Como estávamos menos resistentes que no dia anterior, até em razão do excesso de empolgação, resolvemos dar uma paradinha para o almoço, no restaurante “Los Nardos”, indicado pela Lu como um dos melhores de Havana.
Apesar de este pertencer ao governo, tivemos a mesma dificuldade que em relação aos paladares: encontrá-lo. Embora pareça exagero, passamos pela porta de entrada do restaurante umas duas ou três vezes, indignadas com aqueles que nos prestavam informações, por nos sentirmos enganadas.
Só depois de muito vagar na calçada diametralmente oposta ao capitólio é que finalmente olhamos para o interior de um recuo, onde havia uma escadinha que “desembocava” no restaurante.
O contraste foi chocante. Enquanto a fachada é malconservada e suja, o interior do restaurante não deixa nada a desejar aos mais requintados restaurantes do Rio de Janeiro.
Os olhos demoram um pouco para se acostumar, já que é exclusivamente iluminado à luz de velas, o que intensifica ainda mais o contraste, entre o exterior quente, barulhento, claro e sujo e o interior, com uma temperatura agradável, a meia luz, e ao som de violinistas profissionais.
Aproveitamos para degustar um filet mignon suculento, pois os restaurantes do governo têm monopólio sobre a comercialização de carne vermelha. Foi aqui que experimentamos também uma maravilhosa banana verde frita, que nada deixava a desejar a sua parente conhecida pelos brasileiros.
Quando terminamos o almoço, haviamos até esquecido que estava claro quando entramos. O sol já estava no poente, o que contribuiu para uma boa foto do capitólio. Aproveitei, também, para tirar uma foto da fonte da índia, que, diferente do que o nome indicaria, não possuia água, para minha tristeza, bem como daqueles que adoram ver as fotos dos meus chafarizes (por aqui a moda é tirar foto das propagandas políticas).
Tentamos visitar, também, a Associação Yorubá de Cuba, onde há um museu dos orixás, mas este já estava fechado. Afinal, nem sempre é possível fazer tudo o que queremos em um único dia.
Tivemos a mesma falta de sorte ao tentarmos visitar a Livraria Internacional, a maior de Cuba, contudo, tinha acabado de fechar. É o preço que se paga por um bom e longo almoço.
Aproveitamos para visitar uma pequena tabacaria e percebemos que tudo o que tinha para vender na Partagás, teria em todas as outras pequenas tabacarias espalhadas pela cidade (viemos descobrir mais tarde que no nosso próprio hotel tinha uma que era inclusive maior que aquela situada na própria fábrica da Partagás, o que nos possibilitou fazer a festa!).
Na volta ao hotel, aproveitamos para dar uma passadinha na pracinha na esquina, onde há a famosa sorveteria da Copélia. De famosa, contudo, só tem o nome, pois pelo menos os dois únicos sabores disponíveis (baunilha e caramelo) eram quase intragáveis, se comparados ao nosso básico Kibon. No entanto, conseguiam ser um pouquinho melhores que os que já tinhamos tentado comer nos hotéis que ficamos hospedadas.
Depois de tomarmos o sorvete tranquilamente na área reservada aos turistas (há uma pessoa destinada a encaminhar os gringos para sua área específica), fomos visitar a parte mais interessante, onde os cubanos tomam não apenas os seus sorvetes, mas fazem do espaço um local de encontro privilegiadíssimo da cidade.
Entretanto, não conseguimos entrar na parte reservada para os cubanos, pois seria necessário aguardar em uma fila kilométrica, a qual não estavamos dispostas a encarar.
Não tivemos muito tempo para relaxar entre a hora em que chegamos no hotel e o horário do show, no Café Taberna, na Plaza Vieja, para assistir uma espécie de cover do Buena Vista Social Club. O esquema é mais ou menos óbvio: paga-se pelo jantar ou por umas bebidinhas por um preço relativamente exorbitante e o show é grátis.
Foi bem divertido ver aqueles velhinhos de boina cantar típicas músicas cubanas, mas a parte mais divertida mesmo foi no final, quando uma gringa completamente bêbada e sem qualquer molejo, resolveu dançar com o dançarino, quase causando um escândalo pelo ciume que provocava no namorado.
O único ponto negativo é que por aqui ainda não “pegou” a lei do fumo e todos fumam não apenas cigarro, como principalmente charutos, deixando o ambiente insuportavelmente esfumaçado e não se permite sequer abrir as janelas, para impedir que os “locais” que ficam assistindo por fora se divirtam mais!
E o que mais me espantou foi que quando eu abri a janela, o próprio cubano que estava assistindo por fora me advertiu sobre a impossibilidade de fazê-lo, e eu logo providenciei uma desculpa que não poderia ser melhor: tenho asma.
08.01.2011
Como era sábado, tinhamos certeza que não conseguiriamos visitar a famosa Universidade de Havana, onde Fidel Castro fez seu curso de direito. Nem adiantou tentar conversar com a segurança que estava nos pés da escadaria, argumentando que havia outros turistas lá dentro, que ela estava irredutível, afirmando que se tratava de universitários.
Quando íamos em direção a Plaza de la Revolución, onde há aquela famosa figura de Che Guevara (e também de Cienfuegos) na frente de um prédio, encontramos um sujeito que era o maior estelionatário.
Embora já tinhamos sido advertidas sobre os perigosos jineteros (além de atuarem comocafetões, fazem “bicos” consistentes em trapacear turistas), o sujeito que me abordou não tinha este título escrito na testa (todos os outros anteriores, que chegavam oferecendo-se como guias de turismo, haviam sido solenemente rejeitados, pois já sabíamos de sua fama.
Só que este não ofereceu qualquer serviço, de imediato, mas apenas informou que era dançarino do Cabaré Nacional, próximo ao Teatro Nacional, e que poderia nos levar no Palácio de la Rumba, caso tivessemos com tempo.
Como ele não foi muito insistente, e parecia uma pessoa relativamente instruída, resolvemos aceitar o convite, mas ele acabou nos passando a perna.
No tal Palácio de la Rumba não havia nada, e ele logo nos convidou para visitar o local que ele costumava dançar (provavelmente o bar pertencente a algum parente seu). Lá nos ofereceu uns mojitos e sequer aceitou a recusa da Flávia, insistindo para que ela experimentasse. O susto foi na hora da conta: tanto os nossos, quanto o que ele tomou e seus conhecidos vieram na nossa conta, e não seria “delicado” questionar, dada a situação de vulnerabilidade que nos encontrávamos, pois ele já sabia até o hotel no qual estávamos.
Resolvemos pagar a conta exorbitante, sem esconder a insatisfação com a picaretagem. Afinal, isso só demonstra que o país não é aquela maravilha que ele estava pregando, pois de nada adianta ele ter cursado universidade e feito pós-graduações em artes, quando para sobreviver precisa dar estes golpes de extrema baixessa em turistas.
Passada a raiva provocada pelo embroglio, nos despedimos sem agradecer e pegamos o primeiro táxi que passou em direção a Plaza de la Revolución, sem sequer tentar acreditar em um outro cubano que insistia para irmos a pé, em razão da curta distância do local. Não estávamos com paciência mais para perder nosso tempo.
Foi a sorte, pois a praça não estava tão perto quanto fora anunciado. Agradecemos ao taxista e retornamos, felizes, ao nosso programa de turista típico, sacando a máquina fotográfica da bolsa para registar aquelas imagens já imortalizadas por muitos outros anteriormente.
Esta parte de Havana, mais moderna, é onde atualmente o Palácio do Governo e a praça é o local preferido por Fidel para proferir seus discursos intermináveis (todo dia 1º, aniversário da revolução, Fidel comparece para falar a seu povo).
Como não poderia faltar, havia um memorial em homenagem a José Marti (já ia escrever “San Marti”). Subimos uma torre de uns quarenta andares, de onde era possível ter uma bela vista panorâmica de toda a cidade.
Estávamos com desejo de comer pizza, pedimos para o motorista do cocotaxi nos levar diretamente para a praça da Catedral, mas acabamos desistindo de fazer o pedido no restaurante El Patio, já que o garçom sequer levou o cardápio: fiquei imaginando quanto tempo não levaria para trazer a bebida e, principalmente, a comida. Fomos, então, direto para um restaurante italiano na redondeza.
Em seguida, visitamos o Castilo de la Real Fuerza, aquele já mencionado que foi construído em uma posição nada estratégica, o que lhe garantiu a antecipação do único destino que poderia lhe ser útil: o de museu. Logo na entrada, podemos tirar foto ao lado da Giraldina “oficial” de bronze, que foi retirada da torre para protegê-la das variações meteorológicas.
Dentro do museu, destinado às navegações marítimas, nada nos chamou muito a atenção, até porque não somos fanáticas pelo tema proposto. Talvez uma estátua de bronze de Cristóvão Colombo mereça o adjetivo de interessante e uma ou outra miniatura de navios. O mais interessante mesmo é a própria fortaleza natimorta, de estilo medieval times.
Ao sairmos da fortaleza, nos deparamos necessariamente (para tristeza de alguns um pouco menos pacientes com minha obsessão por livros) com a feirinha de livros que contorna a Plaza de Armas. Logo pensei em uma desculpa para aumentar minha “coleção” de livros cubanos, e lembrei de uma pequena constituição da república que eu havia visto exposta com algum livreiro. Foi só descrevê-la para aquele que estava a minha frente que, depois de umas duas ou três tentativas frustradas, ele acabou conseguindo exatamente aquela que eu pretendia: bem pequenininha para não aumentar o peso da mala.
Resolvemos aproveitar o restinho da tarde para passear pela rua Obispo, uma das mais movimentadas da cidade, onde há um incipiente comércio que proporciona aos nativos uns produtos de natureza essencial, além de outros que tecnicamente não mereceriam este adjetivo, mas que nós ocidentais não conseguiríamos viver sem.
No final da rua Obispo, um pouco antes do famoso restaurante El Floridita, encontra-se a maior livraria da cidade, que no dia anterior não pudemos visitar, pois já estava fechada. No entanto, foi dificil acreditar que se tratava realmente da maior livraria cubana, pois a variedade de títulos era ínfima se comparada a uma modesta livraria brasileira. O que mais havia na livraria eram espaços vazios, o que fazia com que o estabelecimento lembrasse mais uma grande papelaria no último dia de “queima total”.
Obviamente não poderia deixar de comprar um ou outro livro novo, e aproveitei para levar do renomado historiador cubano Fernando Ortiz, que fez um profundo estudo sobre as raízes da escravidão. No entanto, como seu livro sobre escravidão estava em falta, acabei comprando um que ele conta a história dos “negros brujos” em Cuba.
Saindo dali, pegamos uma “bicitáxi” até o Malecón, embora este auxílio tenha nos causado um certo peso de consciência, pela injustiça de fazer o sujeito carregar duas pessoas unicamente com a força motriz de suas pernas esquálidas.
Conseguimos chegar ao Malecón antes do por do sol, o que nos proporcionou um brinde da natureza: o céu estava com nuvens esparsas, o que acaba fazendo com que a beleza do poente acabe se intensificando, com a dispersão dos raios solares entre as nuvens.
Ao retornar para o hotel, empreitada esta que tentávamos realizar a pé, pelo Malecón, não conseguimos resistir à tentação e acabamos chamando um cocotaxi, depois de chegar a conclusão que o calçadão é muito maior do que aparenta.
Não sei se já comentei anteriormente, mas é que não podíamos dizer que éramos brasileiras que logo mencionavam, com um sorriso de orelha a orelha, a novela Favorita. Certamente é o primeiro país do mundo que não faz referência a Ronaldo ou Kaká, fato este que me reconforta um pouco ao concluir que o Brasil não se restringe ao futebol: temos também novelas!
À noite, fomos jantar no paladar “La Guarida”, restaurante situado no prédio onde foi rodado o famoso filme cubano “Morango e Chocolate”. O choque é inevitável: ao sermos “despejadas” no local pelo taxista, o primeiro impulso de uma pessoa qualificada como “normal” seria de retornar ao táxi e pedir para voltar para o hotel. No entanto, como gosto de assumir riscos, fiquei fascinada com a excentricidade do local: finalmente poderíamos entrar em um prédio tipicamente cubano, para conhecer a verdadeira realidade (não encarem como um pleonásmo, já que o governo sempre tenta nos impingir uma “realidade” inexistente).
É inacreditável como as pessoas conseguem viver em condições subumanas, cuja privacidade é relativizada pela ausência de janelas e até paredes, e, ao ver um bando de crianças pedindo esmola ao justificar a pretensão mostrando as sandálias furadas,  logo me repreendo por ter qualificado o local como excêntrico.
Depois de subirmos dois lances de escada, chegamos finalmente na porta do restaurante. Logo depois da porta ser aberta, rapidamente esquecemos da realidade exterior: ninguém diria que aquele restaurante estiloso se situaria dentro de um prédio nas condições supra descritas.
O ambiente é agradabilíssimo, mas não pude deixar de perceber que as taças nas quais foram servidos os vinhos eram diferentes entre si. Só depois de comentar esta observação com a Flávia é que finalmente percebi que a assimetria, não apenas dos copos, mas de todos os utensílios e móveis do restaurante, era proposital. Ou melhor, talvez nem o fosse inicialmente, dada a dificuldade de obtenção dos produtos, mas a proprietária logo transformou este tipo de carência em um estilo único, literalmente.
Tomamos um delicioso vinho chileno Marques de Casa Concha, por um excelente preço (incrivelmente mais barato do que em qualquer supermercado brasileiro). Os pratos fazem jus ao nome do restaurante: comi um peixe delicioso, que desmanchava na boca, sem deixar nada a desejar para os melhores restaurantes brasileiros). Em um ímpeto de embriaguez temporária (para não dizer loucura), cheguei a desejar morar em Cuba.
Como já havíamos sido advertidas para não nos assustarmos com os táxis “especiais” contratados pelo restaurante, entramos logo naquele que nos aguardava, até porque não parecia aconselhável permanecermos naquela rua escura e deserta...
09.01.2011
Dormimos sabendo que a primeira empreitada do dia seria sacar dinheiro, pois já estávamos sem um tostão. Só não sabíamos que esta “empreitada” nos tomaria quase a metade do dia: o caixa eletrônico do banco situado embaixo do nosso hotel não funciona domingo.
Perguntamos onde seria o caixa eletrônico mais próximo: talvez no Hotel Nacional, a umas dez quadras de distância. E lá fomos nós, em um passeio matutino ao domingo, em busca daquilo sem o qual não se vive nem em um país em guerra contra o capitalismo.
No caminho, fomos abordadas para umas “jineteras” que insistiam em saber para onde iríamos. Como já haviamos dado, no dia anterior, a nossa dose de cooperação para este tipo de serviço, fazendo o imprescindível papel de turistas otárias, resolvemos ignorar as meninas e seguir rumo a nosso destino.
Logo depois foi a vez de um rapaz, com pinta de “galã”, tentar se aproximar para puxar um papo, o qual, assim como suas compatriotas anteriores, foi solenemente ignorado. Como estes sujeitos são insistentes!
Chegando no Hotel Nacional, foi quase impossível descobrir onde tinha um caixa eletrônico: até porque não seria em um caixa eletrônico que sacaríamos dinheiro, mas sim em uma casa de câmbio. Só então compreendemos que, apesar de não termos um centavo sequer em quaisquer moedas estrangeiras, estas casas de câmbio poderiam ser bem úteis, já que nelas também podemos “sacar” dinheiro pelo cartão de crédito.
E, por sorte, fomos as últimas clientes cuja entrada foi permitida: chegamos um minuto antes do meio dia, quando os funcionários saem para almoçar e só retornam depois de uma hora da tarde.
Várias personalidades renomadas já ficaram estabelecidas neste Hotel (só não me perguntem quais, pois sou péssima com nomes!).
Como já tínhamos “perdido” toda a manhã em busca do famigerado caixa eletrônico, resolvemos relaxar, tomando uma cervejinha (Bucaneira, claro!), no famoso jardim situado nos “fundos” do hotel, cuja vista abrange nada mais que todo o Malecón de Havana, desde a embaixada americana, até o farol da fortaleza dos Reis, no outro lado da baía.
Em seguida, pegamos um cocotáxi para a famosa calle de hamel, uma pequena rua povoada de obras de arte pop, desde grafites coloridos nas paredes, até instalações com banheiras, ferros velhos e todos os utensílios mais bizarros que possamos imaginar, totalmente transfigurados!
E, para completar, domingo é dia de rumba, quando os cubanos se reunem para confraternizar dançando e bebendo, em um estilo que lembra muito os nativos tupiniquins.
Apesar da significativa concentração de pessoas, que chega a causar claustrofobia aos desavisados, a rua é realmente fantástica, encantadora. Não poderiamos ter ido embora de Cuba sem antes conhecermos este cantinho encantador, onde se permite aos artistas cubanos algumas extravagâncias, desde que, obviamente, sem manifestações anticastristas.
O motociclista do cocotaxi que nos conduziu até Havana Vieja nos contou várias histórias (verídicas!) sobre a (dura) realidade cubana. Entre elas, a que mais nos chocou foi a dificuldade que um cubano tem para conseguir uma autorização, de no máximo trinta dias, para viajar para fora do país.
E, se o sujeito resolve dar uma “estendidinha” nas suas férias, ou decide ficar permanentemente em um país onde não há racionamentos, ele recebe uma espécie de punição sumária, de um país em que o princípio da individualidade da pena não passa de um estrangeirismo digno de países capitalistas, nos quais não se conhece a “solidariedade” na desgraça.
Referida punição consiste na perda não apenas dos seus próprios bens, como de sua família que, se tiver a infelicidade de permanecer na ilha, acabará aumentando o contingente dos “sem teto”.
Nos explicou, também, que os “cocotaxis” pagam uma taxa mínima diária de 60 CUCS, ou seja, 60 dólares para o governo, taxa esta mais alta do que a cobrada dos taxistas tradicionais. Isso porque o governo sabe que os turistas, seus únicos clientes, usualmente dão preferência ao que é diferente.
E, se não conseguem obter o valor mínimo estabelecido para o governo, ainda que trabalhem incansavelmente durante todo o dia, são constrangidos a pagar a diferença do próprio bolso (!) sob pena de perderem a licença para explorarem esta atividade econômica (todo dia devem prestar contas ao governo e a obtenção do veículo no dia seguinte está condicionada ao pagamento da taxa diária de exploração – literalmente – do dia anterior).
Não imaginem, contudo, que estes pobres coitados são bem remunerados pelo governo: ganham no máximo o equivalente a 10 (dez) Cucs mensais (!), já que seu salário é pago na moeda nacional (aproximadamente 250 pesos cubanos).
A disparidade é muito mais gritante do que qualquer homem médio, dotado do mínimo de bom senso, poderia admitir. No entanto, o que impele estes cocotaxistas a prosseguir na sua empreitada é, sem dúvida alguma, a esperança de conseguirem superar a cota diária e embolsarem a diferença, caso não sejam compelidos a “investirem” no pagamento de propina (na sua acepção que possui na língua portuguesa e não no castelhano) a um dos inúmeros fiscais corruptos que lhes extorquem diariamente.
Nós, inclusive, tivemos a oportunidade de fazermos uma rota totalmente alternativa, cujo motivo foi exatamente desviar daquela sob fiscalização, já que a cota da propina já havia se esvaído.
Não precisamos de muita imaginação para deduzir que não levará muito tempo para esta panela de pressão explodir, já que, por mais retórica acumulada que a família Castro possua, dificilmente consegue-se justificar tamanha disparidade entre as duas moedas usadas no país.
Até porque uma delas, o CUC, é totalmente fictícia, cujo valor é, paradoxalmente, garantido pela moeda sobre a qual o próprio governo derrama toda sua ojeriza: o dólar americano! Não sei se já havia comentado isso antes, mas, de qualquer forma, é impossível não se ficar perplexo diante de tamanha falta de coerência...
O governo subestima, ainda, a filosofia do clássico economista Adam Smith, sobre a inexorabilidade da regulação da economia pela “mão invisível” do mercado. Ainda que economia não seja o meu forte (fui, inclusive, reprovada na faculdade de direito nesta disciplina), não é dificil concluir que os comerciantes darão, cada vez mais, preferência aos pesos conversíveis, que acabarão fazendo jus ao nome e se “convertendo” em moeda nacional. O problema é que os funcionários públicos cubanos continuarão recebendo em pesos cubanos...
De qualquer forma, se o governo insistir em manter severas restrições à liberdade em todos os seus viés, talvez o regime ainda que moribundo, sobreviva por alguns anos.
No entanto, não resistirá por muito tempo, já que a invasão da internet, ainda que restrita a uma minoria e a uma velocidade insuportavelmente lenta para a maioria dos reles mortais, aliada ao estímulo ao desenvolvimento do turismo, acabará insulflando nas almas nativas uma sementinha de indignação que regada pelo desespero germinará em uma verdadeira revolução, que poderá, inclusive, se legitimar com fundamento em todos aqueles princípios que um dia já foram invocados orgulhosamente pelo Comandante Fidel Castro, cuja mumificação é incipiente (sei que a parada da sementinha foi bem brega, mas valeu a tentativa do “toque literário”).
Como não aguentávamos mais a comida afro-cubana, resolvemos experimentar um típico restaurante italiano, considerado o melhor de Havana. Realmente a macarronada estava uma delícia, acompanhada pela Tu-Kola (muito melhor que a Coca-Cola comum).
Terminado o almoço, resolvemos dar uma voltinha na praça da Catedral, onde foi possível admirar verdadeiras pérolas, em um domingo ensolarado.
Além de vários cubanos pintando ao ar livre, em uma cena que dá até certa nostalgia (talvez dos artistas do Campo de São Bento...), muitos outros se arriscam incorporando os personagens mais ousados, na busca por um Cuc, que pode representar mais que o salário diário de um médico (estes ganham, em média, o equivalente a 30 Cucs mensais e isso sem poder escolher a especialidade pela qual nutrem maior apreço, já que esta é igualmente determinada pelo governo, de acordo com as necessidades locais, assim como a própria carreira de médico, advogado ou engenheiro o é).
Dentre as melhores “peças”, havia uma cigana disposta a ler a mão (e até o pé se alguém desejasse), cuja imagem vinha sendo ignomniosamente explorada pelos turistas, que pretendiam tirar fotos sem entregar-lhe a respectiva contribuição pecuniária, como se aquela fantasia que deveria estar lhe sufocando sob o sol escaldante fosse uma roupa que vestisse voluntariamente e que fizesse parte do centro histórico.
Tirei foto com um sujeito barbudo que degustava um robusto charutão e, depois, não resisti de pedir a um casal de velhinhos para tirar uma foto entre eles. O marido, que possuia mais que o dobro da idade da mulher, era visivelmente doidinho, mas muito divertido. E, além disso, parecia possuir um grande segredo com as mulheres, já que, segundo explicou sua própria mulher, muitas correm atrás dele e, uma vez, ela teve que chamar a força policial, pois estava sendo atacada por uma de suas fãs.
Esta história parecia uma espécie de “realismo fantástico” tão ou mais absurda do que aquela narrada pelo próprio doidinho, segundo a qual ele teria sofrido tortura no governo Batista e, ao ser libertado por Fidel Castro, teve a impressão que a Catedral de São Cristóvão fosse despencar sobre si, como em uma “onda lisérgica”.
Fiquei imaginando quantas vezes que uma história absurda deve ser repetida na cabeça de uma criança para que ela se torne verdadeira, sendo possível que talvez se incorpore até à sua própria realidade...
Este casal encantador emendava um papo no outro e insistia que no nosso retorno a Cuba deveríamos nos hospedar em sua casa, convite este que retribuímos com um justo agradecimento, pois não seria de bom tom oferecer o mesmo para eles, ante as informações que já havíamos obtido sobre a dificuldade de se sair do país.
No retorno para o hotel, passamos por uma farmácia histórica, com inúmeros potes de cerâmica, onde eram armazenadas as plantas medicinais utilizadas como medicamentos. Na realidade, sequer poderíamos chamá-la de “histórica”, já que até hoje é necessário se valer desta medicina alternativa, em razão do embargo econômico.
O mais interessante, contudo, é a leitura de um trecho da história da farmácia, no qual se informa que, no passado já se utilizou como medicamento um concentrado de cana fermentada misturada com mel, conhecido como “aguardente”, que poderia, contudo, causar um efeito colateral não desejado: a embriaguez (ou seria a ressaca?).
Como a apresentação do ballet “Cascanueces” seria às cinco horas da tarde, tivemos que nos apressar e tivemos que voltar logo para o hotel.
O espetáculo foi fantástico! Me senti retornando a infância, com todo aquele figurino colorido, remetendo a multiplicidade de fantasias infantis. E os bailarinos merecem pertencer a companhia de ballet qualificada como a 5ª melhor do mundo (só perde para duas russas, a de Nova Iorque e de Londres).
A maior emoção, contudo, foi logo no início, quando todos os cubanos se levantaram para aplaudir a homenageada de honra, a diretora do espetáculo, Alícea, famosa bailarina cubana, cuja idade e visão não lhe permitem mais dançar, mas não deixa de ser o orgulho da nação.
Como o Floridita fica próximo ao Teatro Nacional, reservamos um espaço no restaurante para o jantar de despedida de Havana, por julgarmos que seria o último dia da viagem.
Tomamos o famoso daiquiri de limão e depois experimentamos de outros sabores, para dar uma variada. Tiramos fotos com estátua de bronze de Hemingway, comemos bananinhas verdes fritas e, finalmente, degustamos o jantar, que não era nada espetacular, embora bem palatável.
Incluimos no programa uma passadinha pela casa de festas mais famosa da cidade, conhecida como “Casa de la Música”. Mas, para nosso desapontamento, a casa só abriria às onze da noite e não passava de nove horas ainda.
Resolvemos, então, adotar um “roteiro” alternativo e fomos em uma pequeno espaço em um hotel nas proximidades, onde os “gringos” se misturam com os/as “locais” que vão em busca de uma esperança de “escapar” da ilha, através de um romance arrebatador, digno de novela brasileira.
Já os “gringos” são visivelmente mais imediatistas e menos “românticos”, mas todos se divertem ao som da animada salsa, que lembra bastante aquela moda de lambada do início dos anos noventa.
Um casal de norte americanos sentou na nossa mesa (o espaço é bem restrito, o que “impõe” a socialização). O marido era visivelmente apaixonado por Cuba (ou seria pelas cubanas?), pois em todas as suas férias de técnico de futebol (isso mesmo!) ele vinha para Cuba (desacompanhado). Foi a primeira vez que a esposa insistiu para conhecer este lugar tão fabuloso, pelo qual seu marido se apaixonou...
Foi neste bar que eu finalmente tive a brilhante idéia de inovar, mostrando para os cubanos como se faz um verdadeiro mojito: esmagando impiedosamente a folha de hortelã! Os gringos, depois de experimentarem, responderam com uma expressão facial visivelmente contrariada pela novidade, mas não demoraram para mudar a opinião e até apreciar aquele saborzinho mais amargo, a ponto de a esposa tentar amassar a hortelã com o próprio canudo. Nunca havia me imaginado ensinando os próprios cubanos a fazer um mojito decente!
10.01.2011
Acordamos cedinho com a vã ilusão de que retornaríamos tranquilamente a nossa terra natal. Até porque, achávamos que já tínhamos esgotado a nossa dose (e até a reserva) de “perrengues” admissíveis em uma viagem. No entanto, estávamos em Cuba e por aqui tudo é possível.
No caminho até o aeroporto, vimos inúmeros outdoors responsabilizando o embargo econômico por todos os males nacionais, na tentativa de induzir seus ilustres visitantes a crer que toda a escassez que lhes é impostas decorre exclusivamente da culpa dos EUA e não do fato de o governo, através de um regime ditatorial, impor a seus cidadãos as mais diversas restrições (há, inclusive, a informação de que as propagandas antigovernamentais seriam proibidas com fundamento na economia de papel, que seria melhor utilizado na produção de livros escolares para crianças! E o pior é que muitos acreditam nessa justificativa!).
Seriamos “despejados” em um terminal no qual não havia qualquer alma viva, se não tívessemos tido a sorte de estarmos acompanhados por um “ex-cubano”, que alertou o displicente motorista do transfer que o embarque da Cubana nunca era realizado por aquele terminal!
Depois de mais de dez minutos de contatos telefônicos realizados, em um verdadeiro teatro do absurdo, o motorista finalmente chegou a conclusão de que o terminal seria exatamente aquele indicado pelo “ex-cubano” e nos desovou nele, sem sequer aguardar para verificarmos a veracidade da informação.
Entramos pacientemente na fila, pois chegamos com mais de três horas de antecedência, muito antes do início do check-in, e permanecemos nela por bastante tempo.
Ao invés dos espertíssimos burocratas cubanos estabelecerem uma fila única, mantiveram as três filas e, para a última delas, havia dois atendentes, o que era aceito por todos. Claro que eu não podia admitir aquilo, até porque eu não estava na fila beneficiada com aquele privilégio.
Mas de nada valeu meu esbravejamento: concluiram que não haveria nada de errado, dando a entender que minha solicitação de que houvesse alternância das pessoas das três filas para serem atendidas no quarto guichê seria puro capricho de uma menina acostumada a práticas mais democráticas!
Antes fosse esta minha última insatisfação com o regime cubano! Chegado o momento do check-in, fomos surpreendidas com a notícia de que não poderíamos embarcar, sob a alegação de haveria um atraso no vôo e que não conseguiriamos pegar a conexão em Caracas!
No entanto, as brasileiras que estavam na fila ao lado haviam feito normalmente o check-in, o que fez com que questionássemos o motivo pelo qual elas poderiam embarcar e nós não.
Foi aí que eles perceberam que eles já haviam feito o check-in de vários brasileiros na mesma situação e tiveram que retirá-los do saguão do embarque, além de devolver a respectiva bagagem!
E isso tudo diante da incerteza sobre a veracidade da informação, já que na tela não havia qualquer informação sobre atraso, mas, ao contrário, contava o vôo como “on time”. Apenas na hora prevista para decolagem é que finalmente apareceu “delay”.
O que seria de nós? Tivemos a desesperadora informação de que havia brasileiros que estavam tentando embarcar desde sexta-feira (já era segunda!) e ainda não tinham conseguido! Havia, inclusive, notícias de que o próprio Fidel (ou o irmão, o que dá no mesmo), teria proibido a Cubana de decolar, em virtude de algum prazo vencido (a funcionária tentava argumentar com alguém, pelo telefone, que só venceria após o final de janeiro...).
Depois da confusão criada, concluiram que nós embarcariamos no dia seguinte em um vôo da Copa Airlines (?), ou seja, o negócio era sério mesmo. No entanto, ao perguntarmos qual seria o intervalo de tempo da conexão no Panamá, fomos surpreendidas com a informação de que seria de 12 (doze) horas! Ou seja, só chegaríamos no Rio de Janeiro na quarta-feira pela manhã!
Claro que as coisas não foram tão simples. Tivemos que esperar durante horas no aeroporto, até que a cubana providenciasse os vauchers da condução e hotel. Além disso, passamos pelo mesmo transtorno da ida, pois, quando chegamos no hotel, já havia passado a hora do almoço. Por sorte, a gerência tinha mais boa vontade que a do hotel anterior e acabamos recebendo um lanchinho de pão com presunto para não desmaiarmos de fome até o jantar.
Enquanto ainda esperávamos “pacientemente” no aeroporto, aproveitamos para bater um papo com um ex-cubano que casou com uma brasileira para fugir do país. Se você não tem qualquer vínculo com o poder, que te assegure privilégios, a única forma de sair do país é se casando, ou no exercício de alguma atividade do governo. De resto, dificilmente se consegue autorização para sair do país. Mas, mesmo quando a saída é permitida em razão do casamento, a permanência fora do país por mais de um ano implica na perda de todos os bens!
Foi aí que entendi como o amigo do advogado que estava na minha frente conseguiu passar quase um ano no Equador sem perder seus bens. É que ele é filho de militar, então as regras seriam obviamente diferentes... Revoltante esta situação.
O mais engraçado foi ouvir os comentários das nossas companheiras de infortúnio, que acreditavam que era o próprio povo que pichasse a rua, com louvores a Fidel. Fiquei impressionada como em nenhum momento lhes passou pela cabeça que não eram marginaizinhos que faziam este marketing político difuso, mas sim os próprios integrantes do partido comunista de cuba (PCC).
Nosso amiguinho ex-cubano nos esclareceu que é agora que o povo está começando a enxergar que a culpa por eles estarem na atual situação de penúria não pode ser atribuída exclusivamente ao embargo econômico dos EUA, mas que significativa parte da responsabilidade deve ser atribuída diretamente ao governo.
Uma das principais armas do governo está na própria educação, já que a utilizam como instrumento para incutir na mente dos jovens que os outros países são terríveis (nós mesmo tivemos a oportunidade de assistir a um programa de televisão que dava a entender que os demais países da america latina eram tão violentos a ponto de convencer qualquer um a nunca sair daquela ilha, suposto oásis de paz e tranquilidade, onde sequer pode haver assalto, pois há falta até de arma de fogo!)
Nosso novo amiguinho disse que era engenheiro em Cuba, profissão esta que lhe assegurava a mísera renda mensal de 19 CUCs, ou seja, 19 dólares. Já um médico recebe um pouco melhor: 25 Cucs. A primeira conclusão que logo me veio à cabeça – é mais rentável trabalhar na porta de banheiros de restaurantes turísticos entregando pedaços de papéis higiênicos para fregueses, serviço este que “custa” em média 0,50 Cucs por “aliviada” do que trabalhar em um centro cirúrgico. Não é que eu nutra qualquer tipo de discriminação por aquelas senhoras de porta de banheiro, mas convenhamos que é bastante desestimulante para alguém que estuda durante longos anos e que é responsável pela vida do paciente...
 No entanto, teve oportunidades de viajar a trabalho, inclusive para a antiga União Soviética, e foi aí que percebeu que a realidade não era exatamente como os governantes pretendiam fazer o povo acreditar que seria. Ele não podia, contudo, falar muito sobre o que via no exterior, pois tudo poderia ser considerado atos contrarrevolucionários.
Imaginem que até dois anos atrás, ou seja, 2009, não havia sequer aparelhos celulares na ilha, enquanto na parte continental, seus habitantes não conseguem mais dar um passo sem essa geringonça, a ponto de o número incorporar à personalidade, como uma espécie de sobrenome.
O acesso à internet, até hoje, é extremamente limitado, já que o governo tem plena consciência de que a difusão de informação sem censuras é a faísca que falta para causar um colapso do Poder.
Aproveitei que ele estava disposto a explicar, e perguntei como se explicaria o paradoxo de o governo ser tecnicamente ditatorial, mas a constituição assegurar que se trata de uma república democrática. Ele explicou que a permanência no Poder é garantida pelo sistema de voto indireto e aberto, no qual as pessoas votam em um vereador, o qual elegerá o deputado e assim sucessivamente. No entanto, sempre são os mesmos candidatos eleitos, até porque as pessoas sabem exatamente o que aconteceria caso não votassem naquele favorável ao governo da situação, até porque não há garantia de sigilo da votação. Então, quando se chega ao topo da piramide de poder, quem é eleito?
Ele confirmou que ninguém pode vender ou compar imóveis ou automóveis, mas apenas permutar por um do mesmo tamanho, pois não seriam tecnicamente “donos”, mas espécie de usufrutuários da propriedade governamental (esta conclusão para se adaptar a nossa realidade foi de minha autoria).
Confirmou, também, a crença de que a saúde é boa e que o acesso é universal, no entanto, assim como no nosso SUS, há filas quilométricas para o atendimento, embora sempre haja um jeitinho para não ter que aguardar...
O cartão de racionamento, que todo cidadão cubano recebe, a fim de que não deixe de receber produtos essenciais como pão, é extremamente limitado (cada pessoa tem, por exemplo, direito a receber um único pão francês por dia).
Há pouco tempo atrás os cubanos eram proibidos de conversar com estrangeiros, para não revelar muito da realidade cubana. Hoje, por sorte, esta proibição vem sendo relativizada, embora ainda haja muitos “olheiros” prontos a denunciar alguém em atos contrarrevolucionários suspeitos...
Quando chegamos no hotel, no final da tarde (permanecemos o dia inteiro no aeroporto!), não tinhamos força para nada, tamanha era a exaustão causada pelos transtornos. No entanto, ainda não era hora do jantar, e, para evitar acordar de madrugada famintas, resolvemos resistir a tentação de dormir e aproveitar para dar uma espiadinha na televisão local, até porque nos outros dias não tivemos muito tempo para isso.
Mas que coisa chata os programas nacionais. Um, especificamente, ganharia o tal prêmio “framboesa” caso não fosse exclusivo para os piores filmes, mas abrangesse todos os programas televisivos do mundo. Chama-se “Cubavisión” e se inicia com a leitura das reflexões de Fidel! Essas reflexões são escritas diariamente no jornal local Gramma e são de uma prolixidade típica do líder cubano. Há, contudo, uma vantagem na versão escrita: quando começamos a achar tudo muito repetitivo, podemos saltar alguns parágrafos e mesmo assim não perder a essência da coisa (assim como é possível compreender uma novela assistindo apenas três capítulos...).
No entanto, a versão “oral” é de muito mais difícil “deglutição”, já que, por ser “ao vivo” não é possível apertar o fast forward, o que faz com que sejamos compelidas a aturar aquela esmagadora chatisse durante uns dez ou quinze minutos, que parecem, na realidade, uma eternidade.
Terminada a leitura do discurso, que mais parece uma religião, iniciou-se o tema do debate da noite: o julgamento do terrorista Posada Carrillos, agente da CIA que teria cometido dois atentados, infelizmente fracassados, contra a vida de Fidel, sendo um deles no Hotel Meliá Cohiba, em 1997, onde a Lu ficou hospedada! No entanto, ele não estaria sendo processado por terrorismo, mas sim  por falsas declarações prestadas em depoimentos judiciais. Só que o que tinha o propósito de ser um debate se transformara em uma repetição insana de cenas cujas afirmações giravam sempre em torno do mesmo tema: o absurdo de Carrillos não ter sido extraditado para Cuba e do fato de ele não estar sendo processado pelos atentados cometidos contra Fidel.
Qualquer pessoa normal não precisa ser submetida a esta sessão de espécie de lavagem cerebral por mais de uma hora para sair do recinto com a certeza de que aquele sujeito merece a pena capital, tamanhas foram as barbaridades cometidas que restaram impunes.
Por sorte não demorou muito para chegar a hora do jantar, embora o programa televisivo não demonstrasse sinais de que pretendesse acabar. Para nossa surpresa, mesmo depois do jantar, a mesma ladainha estava sendo repetida reiteradamente! Por sorte, estavamos com sono suficiente para não ter que aturar nada mais daquilo... Agora é ainda mais fácil entender porque os cubanos gostam tanto das nossas telenovelas!
11.01.2011
Embora eu tivesse com bastante sono, tive muita dificuldade para dormir, talvez pela ansiedade ou em razão do excesso de estafa mesmo.
Acordamos novamente de madrugada, mas, por sorte, não houve qualquer entretempo e foi possível embarcar normalmente, bem como desfrutar dos confortáveis assentos da Copa Airlines.
O vôo para o Panamá transcorreu sem maiores entretempos e, chegando lá, fomos logo  providenciar um City Tour para conhecer a cidade, pois não aguentaríamos permanecer por doze horas trancadas no aeroporto.
O city tour iniciou-se por uma visita ao Shopping próximo ao aeroporto. Embora inicialmente tenha ficado revoltada com a visita compulsória ao shopping, até que não foi de todo ruim, pois aproveitei para comprar, por um preço muito mais acessível, algumas coisinhas que eu estava precisando.
A visita a parte antiga da cidade não foi, tampouco, interessante, pois o sujeito que falava no microfone estava visivelmente sem paciência para o exercício do seu labor, o que desestimularia qualquer turista, ainda que estivesse no local por opção.
E o pior: não era possível tirar fotos dos locais, pois, contrariando minhas expectativas menos positivas, em momento algum houve uma parada para tanto.
A parte mais interessante do nosso tour improvisado foi a visita à última eclusa do canal do Panamá (afinal é o que o mundo mais conhece deste país, cujo território já fez parte dos EUA).
Tivemos a oportunidade de ver uma grande embarcação aguardar o nivelamento da água para abertura das portas, procedimento este significativamente demorado e desaconselhável para pessoas extremamente ansiosas. Fico imaginando a paciência para repeti-lo diversas vezes!
O canal fica situado a uns 25 (vinte e cinco) metros acima do nível do mar, estratégia esta adotada para viabilizar a navegação do canal, que de outra forma seria obstruída pelo relevo montanhoso. Só não consegui entender a vantagem de vinte e cinco míseros metros, quando as montanhas são significativamente mais altas... No entanto, de nada adiantou minha vontade de entender, pois o motorista do ônibus apenas repetiu a explicação incompreensível dada anteriormente.
Mesmo com toda esta demora para atravessar o canal, a economia de tempo e dinheiro é significativa, já que evita contornar toda a América do Sul para chegar ao oceano Atlântico ou vice-versa. O valor do “pedágio” varia de acordo com a mercadoria que é transportada. O nosso navio, por exemplo, transportava automóveis e pagou duzentos mil dólares para fazer uso do canal. O pagamento deve ser antecipado e in cash.
Antes mesmo de entrar no canal, o capitão do navio deve passar o comando para o Prático que trabalha no canal, exaustivamente treinado para evitar qualquer avaria tanto ao navio quanto às instalações. E, este sujeito certametne ganha uma fortuna!
No retorno, passamos pela parte mais moderna da Cidade do Panamá, que não deixa a desejar a qualquer cidade moderna do mundo, com muitos edifícios de arquitetura arrojada, mas tampouco tivemos a oportunidade de fotografar decentemente, até porque era o mesmo motorista mal humorado que nos conduziria de volta ao aeroporto.
Chegando lá, aguardamos pacientemente o vôo (ainda faltavam umas quatro horas) e, finalmente embarcamos rumo ao Rio de Janeiro, onde não teriamos nem tempo de tomar banho para pegar o carro e ir direto para Valença...
De qualquer forma, poderiamos ficar tranquilas, pois não estávamos mais sob a tutela da “cubana” ou de quaiquer empresas pertencentes ao mesmo “holding” governamental!



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